“Em uma noite onde tudo se encaixa, parece impossível
imaginar que o tempo tenha passado desde a primeira
vez que você parou, sentou ou correu para esconder
atrás do sofá quando um ser de nariz torto, olhos negros,
cabelos bagunçados, meio homem e meio Muppet
surge de uma cova de um de seus piores pesadelos
para lhe dizer o que aconteceu com sua escola.”
(Alice Cooper - Bem-vindo ao meu
pesadelo. Dave Thompson, 2013)
"Quando eu era um jovem adolescente, a música do Alice
Cooper com a banda original era o meu mundo inteiro.”
(Steve Vai, guitarrista, em entrevista ao também
guitarrista Glen Buxton, seu ídolo, falecido em 1997)
"No entanto, em 1984, uma geração inteira surgiu,
que não apenas havia crescido imitando Alice no
espelho do quarto, da mesma forma que ele cresceu
imitando Elvis, mas ainda faziam isso agora."
(Alice Cooper - Bem-vindo ao meu
pesadelo. Dave Thompson, 2013)
Desde aquele inesquecível março de 1973, às vésperas da quarta grande crise do Petróleo e o país vivendo o seu último ano do chamado “milagre econômico”, os jovens rockeiros brasileiros não falavam em outra coisa: o sucesso e as anarquias do polêmico Alice Cooper, que por aqui passara a se conhecido como “Tia Alice” – esse era o principal combustível que movia a cabeça dos rockeiros do período.
A figura do grande front man estava no auge dominando todo os meados da primeira metade desta “era de excessos” iniciada na década anterior.
Neste mês, o célebre disco “Billion Dollar Babies” era lançado no
país e “No More Mr. Nice Guy” galgou vertiginosamente as paradas de sucesso,
levando a banda a faturar só com este disco cerca de 3 milhões de dólares em
todo o mundo, e como consequência o disco se tornou o álbum mais vendido da gravadora Warner Brothers, galgando dois meses depois do lançamento a 1ª posição da Billboard! Com a façanha, os membros da banda se tornarem os novos milionários do rock, e um ano depois, já se destacando pessoalmente, lá estava Alice, de cartola e bengala, na capa de nada mais nada menos que a imponente revista Forbes, com a chocante chamada: "The New Millionaires"!...
Uma verdadeira loucura estava instalada – não se via nada igual desde a Beatlemania! O Brasil rockeiro, finalmente, se rendia às loucuras de “tia Alice”!
Nesta época, eu e o
Weber já estávamos completamente fisgados pelo rock, e nosso primeiro grande
ídolo do rock era, desnecessário dizer, o próprio Alice Cooper!... Lembro-me
que, já na primeira e simples menção ao seu nome, Alice Cooper me causara um
tremendo impacto, e, diga-se, impacto negativo: “Como um homem podia ter o nome
de uma mulher?!” Àquela idade, isto soava como uma verdadeira “heresia”!
Curioso é que, desde o início, Alice Cooper era o nome da banda e não de Vince
Furnier, o cantor, mas não havia jeito – Alice Cooper, no entender de todos,
era o próprio cantor e ponto final! Só com o final desta formação, após o
último disco “Muscle of Love”, é que o cantor se apossara definitivamente do
polêmico batismo, que era nada mais nada menos que o nome de uma bruxa que viveu no século 17.
“Alice Kids!”
Havia algo de perigoso e sobrenatural em sua figura e sua música que cativava de imediato – era ouvir e se tornar fã de pronto! Alice era um artista impar, com uma proposta nova e radical – o primeiro vilão do Rock! –, o que lhe dava ao mesmo tempo uma aparência de entidade provocante e até mesmo violadora dos bons costumes. Para a mídia, era um artista possuído pelo espírito do perigo e da rebeldia, e o terror dos pais que ficavam horrorizados vendo seus filhos atraídos por aquele "ser repugnante"!... Com sua aparição, algo explodiu e nossas cabeças e já não éramos mais as mesmas crianças inocentes: queríamos ser como ele, ser transgressores, rebeldes e polêmicos! Curiosamente, em momento algum nossos pais nos repreenderam – principalmente o meu pai, de quem era para se esperar alguma atitude de reprovação –, dizendo que era para tiramos essa besteira de rock da cabeça, pois corríamos o risco de nos tornarmos crianças ruins e “mal-encaminhadas”.
O que eu sei dizer é que, desde que entrou em minha vida, o Alice Cooper tornou-se o dono de quase de todo o meu gostar de rock pesado, ou, como se dizia, "rock horror". Quando ouvi sua banda e sua bizarra figura pela primeira vez, uma explosão foi detonada aqui dentro da minha cabeça, e isto, naturalmente, são coisas que, hoje, infelizmente, não acontecem mais com a mesma intensidade e impacto daqueles dias. É normal na pré-adolescência a gente ouvir um estilo novo de música ou admirar a imagem cativante de um novo ídolo e ficar maluco, em êxtase, e isto talvez se deva à uma grande quantidade de hormônios liberados descontroladamente nesta idade. É uma fase em que muitas coisas mudam, inclusive nossas opiniões. Alice Cooper e Rick Wakeman, suas músicas e seus visuais mexiam fortemente com a cabeça da meninada debutante no rock, e eu fui um desses afortunados meninos!
Ainda hoje, não consigo mensurar com precisão o que causou em mim não só a figura de Alice, mas, em especial, a primeira audição do disco “Killer”, e mais especial ainda a música “Halo of Flies”. Eu simplesmente não acreditava no que estava ouvindo! Enquanto me deliciava com o som, aquela voz, aquelas guitarras!... com a capa nas mãos, deitado no chão eu via a foto daquela cobra sinistra – a jiboia Kachina! –, aquela combinação impactante de luzes negra e laranja e ficava abestalhado! E estas luzes se acenderam para sempre na minha cabeça, e, coincidentemente, seis anos depois eu ganhei um apelido definitivo: Cobra!...
Ao final da turnê “Killer”, o disco chegara à meio milhão de vendas! Além disso, a Kachina fora a estrela da capa mais fotogênica daquele ano, fartamente popularizada em fotografias pela mídia escrita. Suas primeiras aparições foram chocantes e aterrorizantes, e os gritos das meninas das primeiras fileiras nos shows não era um histeria pós-Beatles, mas puro pavor causado pelo asqueroso réptil!...
Hoje entendo toda aquela euforia, pois é justamente nessa idade que algum “super-herói” do momento faz com que transfiramos a ele toda a nossa necessidade de liberdade e autonomia. Nessa fase simbiótica, brigamos com nossos próprios corpos e mente em fase de transformações, e sonhamos com nossos ídolos em carne e osso, protegidos que estão pelo escudo da celebridade. Os sons ouvidos na infância, em especial os que mais nos cativaram, sempre carregam forte conteúdo emocional, e a memória sonora pode retroceder muitos anos ao reouví-los, e a música do Alice Cooper está entre as principais desse período – é ouvi-lo e tudo aquilo vem à mente quase que intacto: o impacto inicial, o “desbunde”, a admiração, aquele então novo sentimento...
O polêmico filme “O Exorcista” havia sido lançado nos “esteites” em dezembro deste mesmo ano, mas enquanto o filme não chegava ao Brasil – o que se deu em 12 de novembro de 1974 –, a saída foi esperar até março quando a Tia Alice traria o seu chamado “circo de horrores” para apavorar a juventude brasileira. Aliás, disseram na época que este filme não teria feito tanto sucesso se o terreno não tivesse sido previamente preparado pelo “circo de horrores” de Alice Cooper, inda que, por esta época – a do citado disco “Muscle of Love” –, a banda já tivesse tomado outra direção.
Já no início de fevereiro um outro filme, não tão apavorante mas provocador. havia mexido com a cabeça da juventude, o sinistro "Os pássaros" do célebre Alfred Hitchcock, filme que – perdoem-me a precisão – passara no Canal 4, às 23hs, tendo reprise no início de julho seguinte! Não assisti ao Exorcista, mas me esbaldei com a invasão de corvos negros naquela cidade beira mar – era um suspense e tanto!
Ainda se falando de horror, no mês seguinte, as coisas amenizariam de certa forma com o festejado e tão esperado lançamento do filme "Woodstock" em circuito nacional, mas, por outro lado, foi um verdadeiro alvoroço, com o rock se sacramentando de uma vez entre a juventude roqueira abestalhada com o grande filme. No dia 27 de março seria o cantor de soul Billy Paul que estrearia seu show no Tuca, também em São Paulo, atraindo um público mais devotado à música romântica e dançante, onde, porém, se podia encontrar fãs do Alice Cooper. Outro show do qual se pode dizer que não competiu com Alice em público, foi o não menos célebre "Holyday on Ice" – o grande show de patinação no gelo –, show que eu jamais assistiria, uma vez que já àquela época eu considerava algo totalmente brega. No entanto, a coisa deu altos ibopes e eu me lembro que de Araras saíram diversas excursões para São Paulo para assistirem estes shows de patinação no gelo, e acho que até minha irmã e minha mãe foram assisti-lo em São Paulo.
Por todo esse aparato horripilante, a banda foi censurada sob a alegação de que era “sangrenta” demais, mas Alice, sábio que era, se defendeu dizendo: “Será que esse pessoal nunca leu MacBeth? Faz parte do currículo escolar inglês.” – ele se referia aos massacres tão comuns nas peças de Shakespeare...
Por onde quer que passasse, o show batia recorde de público, e o “Billion Dollar Babies” seria o álbum mais bem produzido até seu lançamento, sendo amparado por sete toneladas de equipamento. Além, disso, havia um consenso entre os críticos, e entre a própria banda, de que, em se falando de visual e performance de shows, não havia nada igual à Alice Cooper no showbizz – eles eram únicos! O show era tão bizarro, que alguém como nada mais nada menos que o polêmico surrealista Salvador Dali – na época com 69 anos!... – idolatrava o cantor e chegou a produzir obras de arte para ele! Ambos foram vistos juntos muitas vezes!
Àquela altura, Alice e seu circo era, em pessoa, a validação da teoria freudiana de que certas experiências horrorosas, num culto mórbido, são assimiladas como fonte de prazer pelas pessoas.
Uma verdadeira loucura estava instalada – não se via nada igual desde a Beatlemania! O Brasil rockeiro, finalmente, se rendia às loucuras de “tia Alice”!
"Seja lá o que for isso, divirtam-se!"...
Neste ano, definitivamente, eu e meus três
irmãos debutamos no rock. Havíamos ganhado uns compactos da filha de um amigo
de meu pai, a Daysi Dadona, e ali tudo se iniciou. O rock surgia em nossas
vidas como a perfeita expressão do sentimento musical e da paixão pela música
dos meninos que éramos – era como que um instrumento de integração da juventude
da época, e quanto mais nele mergulhávamos, mais se tornava ele um consenso
entre os amigos que o curtiam. Neste ano, o rock já era "de maior",
possuindo então seus meros 18 anos de existência, enquanto nós ainda andávamos
de calças curtas...
Mesmo morando naquele lugar, que poderia ser considerado um lugar isolado em termos de informação do Primeiro Mundo, não estávamos em situação muito diferente daquele jovem judeu de Woodstock, que interrogou dois hippies à caminho do festival, perguntando para onde iam vestidos daquele jeito, e ambos disseram que estavam à caminho do "festival de rock de Woodstock". E o "alienado" judeu lhes retrucou sorrindo: "Seja lá o que for isso, divirtam-se!"...
Poderá parecer ao leitor que estou querendo romantizar esse nosso “isolamento” na zona rural de uma cidadela do interior, mas gostaria de lembrar aqui uma curiosa história protagonizada por meu irmão Weber, história esta que abaliza esta minha colocação. Um certo dia – era 1975 –, estava ele a ouvir Alice Cooper na janela de nosso quarto que ficava ao lado da entrada do novo escritório da Usina, quando um moço, atraído pela música, se aproximou e puxou um papo. Esse moço, que era oriundo de São Paulo e estava ali à negócios, bastante surpreso, desabafou ao meu irmão algo assim: “- Eu jamais ia imaginar que, aqui nesse fim de mundo, ia me deparar com um menino curtindo Alice Cooper na janela de uma casa da zona rural!” E meu irmão, tão surpreso quanto o paulistano, a primeira novidade que ele me contou quando retornei da escola no final de tarde foi exatamente isto.
Mesmo morando naquele lugar, que poderia ser considerado um lugar isolado em termos de informação do Primeiro Mundo, não estávamos em situação muito diferente daquele jovem judeu de Woodstock, que interrogou dois hippies à caminho do festival, perguntando para onde iam vestidos daquele jeito, e ambos disseram que estavam à caminho do "festival de rock de Woodstock". E o "alienado" judeu lhes retrucou sorrindo: "Seja lá o que for isso, divirtam-se!"...
Poderá parecer ao leitor que estou querendo romantizar esse nosso “isolamento” na zona rural de uma cidadela do interior, mas gostaria de lembrar aqui uma curiosa história protagonizada por meu irmão Weber, história esta que abaliza esta minha colocação. Um certo dia – era 1975 –, estava ele a ouvir Alice Cooper na janela de nosso quarto que ficava ao lado da entrada do novo escritório da Usina, quando um moço, atraído pela música, se aproximou e puxou um papo. Esse moço, que era oriundo de São Paulo e estava ali à negócios, bastante surpreso, desabafou ao meu irmão algo assim: “- Eu jamais ia imaginar que, aqui nesse fim de mundo, ia me deparar com um menino curtindo Alice Cooper na janela de uma casa da zona rural!” E meu irmão, tão surpreso quanto o paulistano, a primeira novidade que ele me contou quando retornei da escola no final de tarde foi exatamente isto.
“Alice Kids!”
Posso até dizer que após conhecer a banda,
o rock se tornara algo como aquilo que o Raul Seixas chamou de “novo way of
life”, e eu já me via tocando bateria, que era o instrumento que eu sonhava
tocar na época, e assim aconteceu cerca de 4 anos depois! Lembro-me que eu
nunca vira nada parecido e tão chocante quanto esse artista num palco, e, como
aconteceu à tantas crianças da época, e muitos se tornaram futuros músicos e
cantores, como este que vos escreve – , Alice impactou e fez a cabeça de uma
infinidade de meninos e meninas daquela geração, que
vieram a ser conhecidos como os Alice Kids.
Havia algo de perigoso e sobrenatural em sua figura e sua música que cativava de imediato – era ouvir e se tornar fã de pronto! Alice era um artista impar, com uma proposta nova e radical – o primeiro vilão do Rock! –, o que lhe dava ao mesmo tempo uma aparência de entidade provocante e até mesmo violadora dos bons costumes. Para a mídia, era um artista possuído pelo espírito do perigo e da rebeldia, e o terror dos pais que ficavam horrorizados vendo seus filhos atraídos por aquele "ser repugnante"!... Com sua aparição, algo explodiu e nossas cabeças e já não éramos mais as mesmas crianças inocentes: queríamos ser como ele, ser transgressores, rebeldes e polêmicos! Curiosamente, em momento algum nossos pais nos repreenderam – principalmente o meu pai, de quem era para se esperar alguma atitude de reprovação –, dizendo que era para tiramos essa besteira de rock da cabeça, pois corríamos o risco de nos tornarmos crianças ruins e “mal-encaminhadas”.
O que eu sei dizer é que, desde que entrou em minha vida, o Alice Cooper tornou-se o dono de quase de todo o meu gostar de rock pesado, ou, como se dizia, "rock horror". Quando ouvi sua banda e sua bizarra figura pela primeira vez, uma explosão foi detonada aqui dentro da minha cabeça, e isto, naturalmente, são coisas que, hoje, infelizmente, não acontecem mais com a mesma intensidade e impacto daqueles dias. É normal na pré-adolescência a gente ouvir um estilo novo de música ou admirar a imagem cativante de um novo ídolo e ficar maluco, em êxtase, e isto talvez se deva à uma grande quantidade de hormônios liberados descontroladamente nesta idade. É uma fase em que muitas coisas mudam, inclusive nossas opiniões. Alice Cooper e Rick Wakeman, suas músicas e seus visuais mexiam fortemente com a cabeça da meninada debutante no rock, e eu fui um desses afortunados meninos!
Ainda hoje, não consigo mensurar com precisão o que causou em mim não só a figura de Alice, mas, em especial, a primeira audição do disco “Killer”, e mais especial ainda a música “Halo of Flies”. Eu simplesmente não acreditava no que estava ouvindo! Enquanto me deliciava com o som, aquela voz, aquelas guitarras!... com a capa nas mãos, deitado no chão eu via a foto daquela cobra sinistra – a jiboia Kachina! –, aquela combinação impactante de luzes negra e laranja e ficava abestalhado! E estas luzes se acenderam para sempre na minha cabeça, e, coincidentemente, seis anos depois eu ganhei um apelido definitivo: Cobra!...
Ao final da turnê “Killer”, o disco chegara à meio milhão de vendas! Além disso, a Kachina fora a estrela da capa mais fotogênica daquele ano, fartamente popularizada em fotografias pela mídia escrita. Suas primeiras aparições foram chocantes e aterrorizantes, e os gritos das meninas das primeiras fileiras nos shows não era um histeria pós-Beatles, mas puro pavor causado pelo asqueroso réptil!...
Hoje entendo toda aquela euforia, pois é justamente nessa idade que algum “super-herói” do momento faz com que transfiramos a ele toda a nossa necessidade de liberdade e autonomia. Nessa fase simbiótica, brigamos com nossos próprios corpos e mente em fase de transformações, e sonhamos com nossos ídolos em carne e osso, protegidos que estão pelo escudo da celebridade. Os sons ouvidos na infância, em especial os que mais nos cativaram, sempre carregam forte conteúdo emocional, e a memória sonora pode retroceder muitos anos ao reouví-los, e a música do Alice Cooper está entre as principais desse período – é ouvi-lo e tudo aquilo vem à mente quase que intacto: o impacto inicial, o “desbunde”, a admiração, aquele então novo sentimento...
1974, o ano do Rock no Brasil!
Considerado na
época como o ano da explosão do rock no Brasil, 1974 nos brindava com mais de
20 álbuns de grupos nacionais do gênero, além do surgimento de 30 novas bandas
profissionais de rock, além de 300 concertos realizados pelo país (quase um por
dia), e mais de um milhão de cópias de discos vendidas. Desde a Jovem Guarda e
a Beatlemania, não se via algo parecido no país.
Ano pródigo também em grandes lançamentos
de discos de rock internacional, o ano seguinte, 1974, traria grandes pérolas:
“Brain Salad Surgery” com o Emerson, Lake & Palmer, que, por incrível que
pareça, tocou muito nas rádios; Grand Funk com “We’are An American Band”;
Razamanaz” do Nazareth, novidade escocesa bem recebida no Brasil; o ótimo
“Live” do Genesis (que seria exibido no Som
Pop da TV Cultura – e que “parece que assisti ontem!”); os ex-Beatles John
Lennon com “Mind Games” e Paul McCartney & Wings com “Band on The Run”, do qual a música “Jet”
foi lançada em clipe no programa Fantástico e eu tive o prazer de assistir!
Nesse entremeio de três meses, contrabalanceando todo esse peso, lindas e marcantes baladas rolavam nas rádios: “Bennie and The Jets”, “Sweet Painted Lady”, “Roy Rogers”, "The Ballad of Danny Bayley" e “Goodbye Yellow Brick Road”, com o baladeiro Elton John; a belíssima “Mandy” com o Barry Manillow; a “maneira” “Save The Sunlight", com Dennis Yost & The Classics IV. Aos que curtiam um “balanço”, não podia deixar de mencionar o famoso “Melô do Puladinho”, ou seja, "Rock Your Baby" com George McCrae; as dançantes “I’m Falling Love With You”, com Little Antony and The Imperials e “Love Me or Leave Me Alone” com o Classic IV. Havia também o impressionante tema instrumental que instigou as bandas de baile de todo o país: “Love’s Theme”, com a orquestra do bonachão Barry White, assim como, mais em meados do ano, "Pick up the pieces", o tremendo funk suingado e seu lindíssimo naipe de sopros, com os branquelos da Average White Band.
Em maio seriam lançados dois clássicos discos
pesadíssimos: o segundo do Led Zeppellin (com um enorme atraso!) e o
último grande disco do Black Sabbath “Sabbath, Bloody Sabbath”. Este,
como o Alice Cooper, também fazia o então “rock horror”, mas Alice
estava na dianteira e era só na sua vinda ao Brasil que o “rapeize”
brazuca falava.
O "horror" estava no ar!
O polêmico filme “O Exorcista” havia sido lançado nos “esteites” em dezembro deste mesmo ano, mas enquanto o filme não chegava ao Brasil – o que se deu em 12 de novembro de 1974 –, a saída foi esperar até março quando a Tia Alice traria o seu chamado “circo de horrores” para apavorar a juventude brasileira. Aliás, disseram na época que este filme não teria feito tanto sucesso se o terreno não tivesse sido previamente preparado pelo “circo de horrores” de Alice Cooper, inda que, por esta época – a do citado disco “Muscle of Love” –, a banda já tivesse tomado outra direção.
Já no início de fevereiro um outro filme, não tão apavorante mas provocador. havia mexido com a cabeça da juventude, o sinistro "Os pássaros" do célebre Alfred Hitchcock, filme que – perdoem-me a precisão – passara no Canal 4, às 23hs, tendo reprise no início de julho seguinte! Não assisti ao Exorcista, mas me esbaldei com a invasão de corvos negros naquela cidade beira mar – era um suspense e tanto!
Ainda se falando de horror, no mês seguinte, as coisas amenizariam de certa forma com o festejado e tão esperado lançamento do filme "Woodstock" em circuito nacional, mas, por outro lado, foi um verdadeiro alvoroço, com o rock se sacramentando de uma vez entre a juventude roqueira abestalhada com o grande filme. No dia 27 de março seria o cantor de soul Billy Paul que estrearia seu show no Tuca, também em São Paulo, atraindo um público mais devotado à música romântica e dançante, onde, porém, se podia encontrar fãs do Alice Cooper. Outro show do qual se pode dizer que não competiu com Alice em público, foi o não menos célebre "Holyday on Ice" – o grande show de patinação no gelo –, show que eu jamais assistiria, uma vez que já àquela época eu considerava algo totalmente brega. No entanto, a coisa deu altos ibopes e eu me lembro que de Araras saíram diversas excursões para São Paulo para assistirem estes shows de patinação no gelo, e acho que até minha irmã e minha mãe foram assisti-lo em São Paulo.
No
palco, o horror em carne e osso!
Mas, voltando à banda, o show prometia:
cada vez mais elaborado, contava com truques de mágica, sangue (de catchup...),
brigas no palco, e, deste show em diante, a forca havia saído de cena para dar
lugar à algo mais aterrador: uma imensa guilhotina! E havia muito mais: travesseiros
de pena despedaçados, bonecos de nenéns decapitados,
melancias massacrados à marteladas, cadeira de dentista, mesa cirúrgica, máquinas de fumaça de gelo seco e bolhas de sabão, bolhas gigantes que se explodiam sobre o público, cadeira
elétrica, sirenes de
polícia, brinquedos infláveis, tochas de fogo, efeitos de raios e trovões na
hora da decapitação, camisa-de-força, espada, muleta, bengala, cartola, latas de lixo, enfim, uma sucessão enorme de acessórios e fantasias que surpreendiam!... Por tudo isso, a turnê de Billion Dollars Babies fora a mais cara e extravagante do EUA na época!
Por todo esse aparato horripilante, a banda foi censurada sob a alegação de que era “sangrenta” demais, mas Alice, sábio que era, se defendeu dizendo: “Será que esse pessoal nunca leu MacBeth? Faz parte do currículo escolar inglês.” – ele se referia aos massacres tão comuns nas peças de Shakespeare...
Por onde quer que passasse, o show batia recorde de público, e o “Billion Dollar Babies” seria o álbum mais bem produzido até seu lançamento, sendo amparado por sete toneladas de equipamento. Além, disso, havia um consenso entre os críticos, e entre a própria banda, de que, em se falando de visual e performance de shows, não havia nada igual à Alice Cooper no showbizz – eles eram únicos! O show era tão bizarro, que alguém como nada mais nada menos que o polêmico surrealista Salvador Dali – na época com 69 anos!... – idolatrava o cantor e chegou a produzir obras de arte para ele! Ambos foram vistos juntos muitas vezes!
Àquela altura, Alice e seu circo era, em pessoa, a validação da teoria freudiana de que certas experiências horrorosas, num culto mórbido, são assimiladas como fonte de prazer pelas pessoas.
"Músculo do Amor"...
O ano foi se desenrolando com outras músicas do disco fazendo sucesso, até que janeiro seguinte, um novo disco da banda seria lançado no Brasil, o não menos polêmico “Muscle of Love”, que deixou muito a desejar em relação ao sucesso de "Billion Dollars...", mas trazia uma das capas mais hilárias do rock, além de um título bastante divertido e, diga-se de passagem, safado...
A partir daí começaram a surgir boatos de que a banda viria mesmo se apresentar no Brasil, coisa que poucos acreditavam, pois nunca uma grande banda de rock pesado havia se apresentado no país, e, pela situação reinante, em plena ditadura, não parecia ser naquele momento que essa “virgindade” iria ser quebrada. O jornal Folha de São Paulo era um dos que cobriam as peripécias da banda numa coluna diária dedicada ao rock em geral. Surpreendentemente, e até hoje não se sabe as verdadeiras razões, este jornal fez uma matéria inexplicável citando que o artista que se apresentaria no dia 30 de março no Anhembi era o David Bowie, quando, na verdade, o show que iria ocorrer era o do Alice Cooper!... Mas não pensem que fomos os únicos a publicar besteiras na imprensa – a revista norte-americana Circus, três meses depois, fez uma reportagem sobre estas apresentações de Alice e falou mais baboseiras do que todas as asneiras juntas publicadas no Brasil.
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Depois de "Killer" do Alice Cooper e "Tudo foi feito pelo sol" dos Mutantes, ambos comprados creio que em janeiro de 1975, me tornei um comprador assíduo de discos. À cada novo disco, um novo deslumbre, um novo ídolo, com os discos assumindo uma importância capital em meu dia-a-dia como meio de entretenimento. Depois disso, meu amor pela música ia além do simples amor pelo som - colocar um disco na vitrola, deitar-se no chão, pegar a capa e ficar viajando em suas imagens tendo a música ao fundo, era uma experiência sensorial única, coisa que, definitivamente, o CD - e pior ainda o mp3 - não são capazes de proporcionar hoje: tínhamos obras de arte palpáveis em nossa mãos, e, no presente, todo mundo sabe disso e não é à toa que o vinil voltou à ativa, menos por obra de saudosistas que cultores da obra de arte, que muitos discos de rock eram, isto para não falar na qualidade superior de som. Eu costumava fazer fichas catalográficas dos discos, e ainda tenho pelo menos uma delas inserida dentro de dois discos do Alice Cooper.
Fazendo jus, em termos, aos músicos da banda, a Circus de julho de 1974, em seu ranking de melhores artistas do ano, colocou Dennis Dunaway como o melhor baixista e Neal Smith como o melhor baterista; porém, eu colocaria também como melhor dupla twin guitar, os dois guitarristas da banda, Glen Buxton e Michael Bruce, que só pelo trabalho genial feito no disco "Killer", deveriam ser lembrados pela eternidade.
The Boxer!
O país começa a acordar para a realidade da nova crise, apesar de o próprio presidente Médici – “feliz todas as noites” – dizer no mesmo mês em que Alice & Cia. aqui desembarcavam, que o Brasil, ao contrário do mundo – perdido em “greves, agitações, atentados e conflitos” –, “marchava em paz, rumo ao desenvolvimento”... Lutas de box de gigantes distraíam o povo nas noitadas televisivas, e o Brasil parava para assisti-las: em 28 de janeiro, na “Luta do Século”, Muhammad Ali seria vergonhosamente derrotado por Joe Frazier. Em 30 de outubro, em nova luta, ele derrota George Foreman e recebe o cinto de Maior Atleta profissional do Ano. E não é que o Alice Cooper tinha sido boxeador antes de partir para a música! O box talvez tenha perdido um boxeador mediano, mas o rock ganhava uma dos seus maiores e polêmicos artistas: o cantor do nariz torto devido à um murro de um boxeador!...
Na TV, pipocavam os “reclames” com a banda, como o humorado clipe da música “Elected”, veiculado pela rádio Excelsior de São Paulo (“Excelsior, a máquina do som!”), em que Alice e banda, esnobando numa limousine, contracenavam com um cômico chipanzé; além disso, citou-se à época que “Elected” era música predileta do John Lennon. Recordo-me de outros dois clipes que me marcaram para sempre: um, o de uma apresentação da música “Unfinished sweet” em que Alice aparecia com um enorme tubo de pasta dental, e outro – o que eu mais gostava de ver e ouvir – era um trecho de um show com a banda tocando “No More Mr. Nice Guy”.
Os vocais de Alice nesta música me deixavam maluco, pois, até então, eu nunca havia visto alguém cantando daquela maneira – Alice tinha uma voz tão “quente” que eu acreditava que seria possível se acender uma lâmpada em sua boca! O som da guitarra fazendo o solo na abertura também me partiram a cabeça ao meio: e eu nunca havia ouvido um som de guitarra tão poderoso como aquele, que, mais tarde vim a saber ser devido ao uso de um bootleneck com distorção e eco, cuja qualidade e potência só fora alcançada em 1978 pelo Eddie Van Hallen no primeiro disco da banda. Durante a música, havia uma passagem em que bolas de látex cheias de talco explodiam sobre a plateia, uma verdadeira loucura na época, e uma tremenda revolução da cabeça do menino deslumbrado que era eu. Vi também o clipe da música “Teenage Lament '74”, mas não me empolguei muito, apesar de seu título ter sido emprestado para batizar a primeira música que compus em minha vida, “Lamento Juvenil”, com melodia inspirada por Raul Seixas, isto, anos depois já morando na cidade. Na verdade, pincei este nome de uma música homônima da banda kraut Karthago, que eu vira num release da revista Pop. Mas por que uma banda alemã titulou uma música em português?!
Tia Alice desembarca no Brasil!
Era no primeiro trimestre de 1974, e os boatos sobre a vinda da banda aumentaram, até que em finais de março a banda finalmente desembarcou no país. Sendo a primeira banda de rock pesado a aportar por aqui, isto estava causando um agitação além do normal na mídia em geral. A imprensa, mal informada e preconceituosa, escreveu muita besteira, e chegaram a chamar a onda de fanatismo que Alice causou no Brasil de “Alicemania” e “Alicemoda”, embora a coisa parecia ser isso mesmo!... Na televisão, o Jornal Hoje e o Nacional acompanhavam todos os seus passos, que o grupo agitava adoidado por todos os lados, e sempre com todos enchendo a cara de cerveja; inclusive, cita-se que o próprio Alice havia caído de amores pela nossa Skol e disse que ia levar caixas e mais caixas dela na volta aos EUA. Quando, na inocência daquela idade, ouvi que Alice tomava uma caixa de cerveja por dia, fiquei abestalhado – não podia acreditar que alguém bebesse tanto e ainda assim detonasse num palco.
A revista Pop lançada no início de março trazia a chamada na capa: “Mamãe não me consegue chamar de Alice” –, e veio com uma reportagem de três páginas que “ouriçou” mais ainda os fãs. Alice esnobava: “Estamos milionários, por isso podemos nos dar ao luxo de cometer qualquer tipo de exagero, sem nenhum grilo.” Na primeira página do jornal encartado na revista, o Hit Pop, a confirmação: “Alice Cooper chega em abril”. Todos ficaram loucos para verem de perto e ouvir aquele artista, que estava sendo considerado “a praga do rock’n’roll que assola os EUA” – a igreja norte-americana o considerava um anti-Cristo, e, ele próprio... um proscrito!... O ibope negativo que recaiu sobre a banda fora tanto que um evangelista da Pensilvânia lançou uma verdadeira cruzada para salvar a juventude americana da “perversão e violência” capitaneadas por Alice Cooper, o “Embaixador de Satã”!....
Não menos equivocada e mal-informada que a primeira e tendenciosa chamada sobre a banda num poster Super Pop, a Folha de São Paulo, num exemplar da época, incluiu no mesmo pacote de andróginos Alice Cooper, Secos & Molhados e Dzi Coquetas. O então encarte Hit Pop da revista Geração Pop, no mesmo ano, em 1972, quando a banda começava a chamar a atenção no Brasil, a Folha de São Paulo, em sua edição de 4 de dezembro publicava sobre eles:
"ALICE COOPER é uma banda sólida de 'rock',
misturada com o que só pode ser descrito como atitudes de perversão sexual e
emocional. As perversões agradarão à quem (1) precisa delas, (2) sabe o que é,
e (3) sabe como
utilizá-las. Alice Cooper é um show 'liberado' para 'voyeurs' que não tem
coragem de assumir suas perversões."
Lembrar que quem abriria os show era o Som Nosso de Cada Dia em sua clássica formação, power trio, me deixa frustrado até hoje: num único show as duas bandas de rock de minha vida!
Na verdade, eu ainda não conhecia o Som Nosso, mas me recordo da primeira vez que eu vi o “Snegs de Biufrais” (lançado em julho de 1974, no ano seguinte): eu havia saído mais cedo do ginásio, e passando pela esquina das ruas Mal. Deodoro e Visconde do Rio Branco, onde havia uma lojinha de discos, me achou a atenção numa estante um disco de capa preta com uns cogumelos e uma borboleta pousada em cima. E eu, mesmo eu estando do outro lado da rua, tive minha atenção despertada por aquela bela capa, e me perguntei: “– Que banda será essa?” Prometi para mim mesmo voltar no outro dia e comprar o tal disco, mesmo sem saber de qual estilo de música se tratava; mas, no fundo, eu sabia que era rock, e dos bons... O disco era usado e, infelizmente, estava sem o encarte. E este, assim como o "Killer", é um disco que eu vou ouvir com a mesma intensidade da primeira audição até o resto dos meus dias – é disco de cabeceira, e mais: de vigília astronômica. Desde a primeira audição, gosto tanto destes dois vinis, que ambos são os dois discos de rock número 1 para mim, estrangeiro e brasileiro. Simon Robinson, crítico de rock, escreveu um livro para um único disco: “In Rock”, do Deep Purple. Acho esses dois "discos da minha vida" tão ricos e densos, que mereciam um trabalho assim, mas não digo que eu escreveria um livro para cada um, porém, faria uma resenha ultra-minuciosa, tanto que tenho para falar de ambos!
Um dia antes da chegada da banda – era 27 de março –, a revista Veja trazia uma reportagem de três páginas, coisa rara atualmente, e mais inacreditável é que o redator era nada mais nada menos o gourmand Silvio Lancellotti!... O bonachão bom-de-garfo, então jornalista, teve a suprema besteira de escrever: “o rock de Alice Cooper e seus amigos não deve receber uma classificação acima de medíocre”. Mal imaginava ele que, dentro de poucos anos, Alice receberia uma gravação de uma música sua, a balada “You and me”, por nada mais nada menos que Frank Sinatra (foto), e vale lembrar que o grande cantor elogiou Alice dizendo-lhe: “Você continua compondo, e eu continuo gravando.”
Curiosas coincidências
Quando a banda desembarcou em São Paulo, ninguém acreditou que na América do Sul existisse uma megalópolis, já que o conceito que se tinha no exterior era a antiquíssima ideia de que o Brasil era quase que um país selvagem, onde só haviam matas, índios e cobras, etc. O próprio Alice Cooper – que quis fazer shows no Brasil se fiando em outro conceito equivocado: o de que a religião oficial do país era a macumba!...–, ao se deparar com a imensidão da cidade cogitou de que São Paulo fosse maior que a própria Nova Iorque!...
Coincidentemente, na noite do primeiro show, ou seja," 1º de abril, estreava na Rede Globo a primeira telenovela a ter como tema a Ecologia, numa época em que a maioria das pessoas não falava nisso. A novela era "O Espigão", cujo enredo girou em torno da desumanização crescente da cidade, e de como o progresso descontrolado podia complicar a vida do ser humano. Assim como o show do Alice Cooper, a novela usava pela primeira vez no país efeitos especiais em grande escala. E a repercussão da novela não foi menor que as do show da banda, pois no dia seguinte à estreia, a imprensa especializada divulgava que a Globo sofria pressões por parte das grandes construtoras cariocas, pois a temática mexia com a chamada "especulação imobiliária", surgida no início da década de 1970.
A ironia do destino: um dos maiores artistas de rock do planeta, oriundo de uma das maiores cidades do planeta, vindo fazer shows com sua cobra na maior cidade da América Latina, crendo que vinha para a pátria da macumba, onde pululavam índios e cobras!...
As coisas estavam mesmo mudadas no país, e Araras participava com seu quinhão, e à tal ponto que nesta época da vinda da banda ao Brasil um novo clube da comunidade negra de Araras – o SERUC, fundado em agosto desse ano – estava realizando bailes em plena Quaresma, coisa que era uma verdadeira heresia até então! Por ali, em plena polêmica moda hippie, negões de cabelos black power, tamanco, shorts curtos e raibãn iam e vinham ante os olhos inconformados de minha avó Ana, vizinha do clube!...
No mês anterior, na manhã de 1º de fevereiro, houve comoção em todo o país com o terrível incêndio que assolou o edifício Joelma, em São Paulo. Araras também fora vitimada pelo incidente, pois dentre os 189 mortos, se encontrava um ararense, o jovem Ivan Ignácio Zurita. Das lembranças que tenho deste dia, recordo-me que foi assustador ver aquele inferno de chamas pela TV, que transmitia o incidente ao vivo. Na escola, porém, entre rockeiros, só se falava no Alice Cooper, e me recordo de, já próximo da virada de março/abril, eu e meus irmãos estarmos em frente à casa do Fernando Martins, amigo que estudava em nossa classe, e o mesmo dizer que ele e seus irmãos iriam assistir ao show em São Paulo, e eu fiquei tremendamente frustrado por não poder ir!
Coincidentemente, na noite do primeiro show, ou seja," 1º de abril, estreava na Rede Globo a primeira telenovela a ter como tema a Ecologia, numa época em que a maioria das pessoas não falava nisso. A novela era "O Espigão", cujo enredo girou em torno da desumanização crescente da cidade, e de como o progresso descontrolado podia complicar a vida do ser humano. Assim como o show do Alice Cooper, a novela usava pela primeira vez no país efeitos especiais em grande escala. E a repercussão da novela não foi menor que as do show da banda, pois no dia seguinte à estreia, a imprensa especializada divulgava que a Globo sofria pressões por parte das grandes construtoras cariocas, pois a temática mexia com a chamada "especulação imobiliária", surgida no início da década de 1970.
A ironia do destino: um dos maiores artistas de rock do planeta, oriundo de uma das maiores cidades do planeta, vindo fazer shows com sua cobra na maior cidade da América Latina, crendo que vinha para a pátria da macumba, onde pululavam índios e cobras!...
As coisas estavam mesmo mudadas no país, e Araras participava com seu quinhão, e à tal ponto que nesta época da vinda da banda ao Brasil um novo clube da comunidade negra de Araras – o SERUC, fundado em agosto desse ano – estava realizando bailes em plena Quaresma, coisa que era uma verdadeira heresia até então! Por ali, em plena polêmica moda hippie, negões de cabelos black power, tamanco, shorts curtos e raibãn iam e vinham ante os olhos inconformados de minha avó Ana, vizinha do clube!...
No mês anterior, na manhã de 1º de fevereiro, houve comoção em todo o país com o terrível incêndio que assolou o edifício Joelma, em São Paulo. Araras também fora vitimada pelo incidente, pois dentre os 189 mortos, se encontrava um ararense, o jovem Ivan Ignácio Zurita. Das lembranças que tenho deste dia, recordo-me que foi assustador ver aquele inferno de chamas pela TV, que transmitia o incidente ao vivo. Na escola, porém, entre rockeiros, só se falava no Alice Cooper, e me recordo de, já próximo da virada de março/abril, eu e meus irmãos estarmos em frente à casa do Fernando Martins, amigo que estudava em nossa classe, e o mesmo dizer que ele e seus irmãos iriam assistir ao show em São Paulo, e eu fiquei tremendamente frustrado por não poder ir!
Meninos assistindo aos polêmicos shows!
Num encontro nacional de juízes no começo de 1973, ao mesmo tempo em que o topless era recém-proibido no Brasil, decidiu-se que jovens de 18 anos podiam freqüentar boates, mas, surpreendentemente, nos shows do Alice Cooper, menores de 13 anos eram vistos aos bandos, e, dentre eles, os futuros críticos de rock Vitão Bonesso, Antônio Carlos Monteiro e Leopoldo Rey, além de futuros músicos de renome da cena rock, como o cantor Kid Vinil e os bateristas Paulo Zinner e Rolando Castelo Jr. Isto revela que eu podia ter ido numa boa neste show, apesar dos meus 13 anos, e além do mais, seria a última oportunidade que eu teria na vida de ver Alice com sua banda original, e, para piorar, estes shows no Brasil seriam os últimos com a formação original, aliás, nem os próprios membros não tinham atinado com isso – de certa forma, a Alice Cooper Band vinha ao Brasil para encerrar suas atividades com seus músicos! Mesmo assim, antes de tudo se acabar, a banda, já nos EUA, realizou cenas para um filme, em 28 de abril em Dallas, e no 29 seguinte em Houston, que resultaram no filme “Good To See Again, Alice Cooper”. À propósito, nos EUA, constatou-se que o público principal de Alice Cooper estava entre os 12 e 15 anos, e o mesmo se deu no Brasil, e eu e, diga-se de passagem, meu irmão fomos partes integrantes desses pequenos fãs, inda que fossemos dois "pés-vermelhos"!...
Com a turnê no Brasil, a banda viria a se tornar a primeira daquele porte a fazer um show na América do Sul. Com a façanha, bateram recorde de audiência em apresentações musicais em locais fechados, marca que até hoje ninguém superou, inclusive entrando para o livro Guiness, com público estimado em 158 mil pessoas, mas no Anhembi consta que a lotação era de 120 mil!... A própria banda afirma unânime que este polêmico show foi o mais louco de toda a sua carreira, o que não deixa de ser motivo de orgulho para nós, que fomos presenteados com um show de uma banda generosa que veio ao país no auge da fama, isto, quando nenhum outro grande artista de rock pesado internacional queria se arriscar por aqui.
E, além disso, não só trouxeram uma gigantesca aparelhagem de última geração jamais vista por aqui, como também venderam parte dela para a Rita Lee e Os Mutantes. Estes, ao que parece, ficaram com os jogos de luz, aquelas mesmas, as luzes negras e de cor laranja usadas na capa do disco “Killer”, que também foram usadas nas fotos internas do disco “Tudo foi feito pelo sol” (na foto o Sérgio Dias sob estas luzes). O valor dos ingressos dos shows no gigantesco Ibirapuera Anhembi (Palácio das convenções), não destoavam bastante dos preços praticados hoje. Enquanto uma cadeira no fundo estava Cr$ 130, hoje seria R$ 325, e nas cadeiras das primeiras filas, que eram Cr$ 160, hoje se cobraria R$ 400!
Se por um lado nós fomos brindados com sua música demolidora e shows sem precedentes, a banda foi coroada com o melhor show de sua carreira e, para aumentar nosso “orgulho nacional”, o baterista Neal Smith, em entrevista à revista Poeira Zine em agosto de 2004, disse que nós brasileiros temos “as mais belas garotas do mundo!”, opinião que já havia sido emitida pelo tecladista Brian Eno em agosto de 1987, numa entrevista em outra revista do gênero, a extinta Bizz, que disse entusiasmado: “O Brasil significa para mim as mais belas mulheres do mundo.”... E não é que esses dois gringos tem um bom gosto impecável!...
Apesar de toda a febre rockeira iniciada neste ano, e o “Billion Dollar Babies” ter virado “mania nacional”, eu ainda não era um comprador de discos, tampouco meus irmãos mais velhos, que se limitavam à gravar fitas cassete com os amigos da cidade. Tínhamos alguns compactos, de que já falei aqui, os clipes de TV com o Big Boy, os “reclames” e era tudo. Meu primeiro disco de rock eu só fui comprá-lo em janeiro de 1975, o já citado “Tudo foi feito pelo sol”, que eu já conhecia devido à uma fita gravada por um dos meus irmãos com o “Caco” Franzini. Não posso descrever qual a sensação de ter este disco dos Mutantes pela primeira vez em minhas mãos – era um luxo só – ouvia o disco com ela diante dos olhos, apreciando o excelente trabalho gráfico da capa dupla, enfim, todo aquele bom gosto que o advento do CD tentou matar, mas não conseguiu de todo.
Brincando de Alice Cooper
Com o movimento glitter, estava na moda rockeiro pintar o rosto e o Brasil não passou incólume à mania, cabendo aos Secos e Molhados o auge do modismo. Inclusive, o próprio João Ricardo foi instado se sua banda era “o Alice Cooper brasileiro”, e ele se safou dizendo que “eles são americanos, refletem a decadência de uma sociedade super-desenvolvida, e nós brasileiros, um país subdesenvolvido.”
E nesta época, pintar o olho de preto imitando o Alice Cooper havia virado uma mania nacional – nos dias dos shows no Brasil muito fãs fizeram isso e até mesmo depois, quando jovens que frequentavam a então “rua do rock”, a Augusta, passaram a desfilar pintados assim. Houveram muitos foliões usando pinturas do Alice Cooper no carnaval de 1974, mas houveram muito mais jovens com pinturas faciais do Ney Matogrosso, que também era outra coqueluche entre a juventude, mais presente ainda no imaginário da galera, que a o trio estava em plena febre do sucesso.
Eu e o meu irmão Weber (foto) não ficamos atrás – ainda que estivéssemos perdidos naquele “fim de
mundo” que era a Usina Palmeiras, estávamos antenados com o mundo
rockeiro – éramos cosmopolitas sem o saber: costumávamos, dentro de
nosso quarto, passar as noites brincando de Alice Cooper, como comprovam
as fotos feitas em nosso quarto, porém, no carnaval de 1976.
Eram dias intensos estes, e nos divertíamos muito. Vira e mexe, evoco os detalhes do interior desse nosso último quarto ali na Usina como se fosse hoje e tudo ainda estivesse ali: as quatro camas, a enorme móvel rádio-eletrola, que destruímos num acidente por esta época, meus discos, meus livros e revistas... Nestas nostálgicas noites em nosso quarto, vivíamos dentro de um pequeno mundo lúdico, um espaço mágico que nos dava o poder de transfigurar o que tocávamos e o que criávamos, vivendo enredos inspirados nas revistas, livros, clipes, shows e discos que curtíamos constantemente.
Pela época do lançamento do disco já sem a banda original, ou seja, “Welcome To My Nightmare” – era agosto de 1975 –, Alice se deixou fotografar junto de diversas crianças, na faixa dos 8 aos 12 anos, todas pintadas igual ele, e ele disse: "Meu negócio é divertir os pequeninos, feito um palhaço de circo suburbano.... Tanto o é que ele agendou apresentações em escola dos EUA. A foto com os "sobrinhos" fora de cunho promocional, e percebam, que pela nossa idade, eu e meu irmão poderíamos estar nesta foto!...
Eram dias intensos estes, e nos divertíamos muito. Vira e mexe, evoco os detalhes do interior desse nosso último quarto ali na Usina como se fosse hoje e tudo ainda estivesse ali: as quatro camas, a enorme móvel rádio-eletrola, que destruímos num acidente por esta época, meus discos, meus livros e revistas... Nestas nostálgicas noites em nosso quarto, vivíamos dentro de um pequeno mundo lúdico, um espaço mágico que nos dava o poder de transfigurar o que tocávamos e o que criávamos, vivendo enredos inspirados nas revistas, livros, clipes, shows e discos que curtíamos constantemente.
Pela época do lançamento do disco já sem a banda original, ou seja, “Welcome To My Nightmare” – era agosto de 1975 –, Alice se deixou fotografar junto de diversas crianças, na faixa dos 8 aos 12 anos, todas pintadas igual ele, e ele disse: "Meu negócio é divertir os pequeninos, feito um palhaço de circo suburbano.... Tanto o é que ele agendou apresentações em escola dos EUA. A foto com os "sobrinhos" fora de cunho promocional, e percebam, que pela nossa idade, eu e meu irmão poderíamos estar nesta foto!...
Alice: na trilha de Luz del Fuego...
QQuanto à jiboia do Alice Cooper, assim como o próprio cantor, , como se viu, ela também rendeu altos ibopes, mas não fora a já citada Kachina que veio ao Brasil – aquela aparece na capa do disco “Killer”, que ela já havia morrido –, e há duas versões sobre a utilizada nos shows: uma, que o Instituto Butantã emprestara um exemplar à banda, e outra, que uma nova cobra fora trazida dos EUA no lugar da finada. Mas a Folha de São Paulo cita que a jiboia era brasileira mesmo, e, inclusive, afirmou que em vários momentos do show ela tentou estrangular o cantor, que teve de ser socorrido por Andy Mills, técnico de som da banda. Mills, em breve, se tornaria namorado de nada mais nada menos que Rita Lee!... Cita-se também que, um dia, essa jiboia comeu tantos ratos que engordou além da conta, e depois acharam-na entalada no ralo do banheiro do hotel onde a banda se hospedada!... Na verdade, esta história era meio que uma reciclagem de uma outra verdadeira ocorrida anteriormente num hotel em Knoxville, no Tenessee, onde Kachina foi vista descendo descarga abaixo em direção aos esgotos da cidade.
Cheguei ainda a ver na TV um sósia de Alice, muito convincente por sinal, com direito à jiboia e tudo mais, fazendo uma pequena aparição numa vinheta de um programa de humor da época, acredito que o Satyricon. Por aí se podia medir às quantas ia a fama de Alice no Brasil, que era alvo constante de todos os setores midiáticos. O mais irônico é que o próprio Alice, crendo que estava num país repleto de índios e cobras, ficava abestalhado quando as pessoas se assustavam ao vê-lo durante os shows se contorcendo com a jiboia enrolada ao corpo!...
O que poucos sabem é que cerca de duas décadas antes de Alice Cooper, alguém aqui no próprio Brasil já vinha causando furor nos palcos ao apresentar-se com jiboias. A artista – e ela era mulher! –, era nada mais nada menos que a polêmica bailarina Luz del Fuego – aquela, como diria a Rita Lee, que “Não tinha medo e foi pro céu, cedo!, com a vantagem sobre o Alice Cooper de que se apresentava não com uma mas duas jiboias enroladas ao corpo, que, corpo que, por sinal, era escultural!
Coincidentemente, neste mesmo mês da vida da banda ao Brasil, passou um filme na TV, que, inclusive eu assisti, o célebre “Sssssss”, ou, como ficou conhecido no Brasil, “O homem-cobra”, que vinha numa onda nascente de alerta ecológico e anti-militarismo, que denunciavam “as guerras do homem contra a natureza, servindo-se dos bons exemplos que os répteis dão”, como colocou uma resenha na revista Pop desse mês. A incrível e chocante maquilagem do ator transformado em cobra ficou por conta do grande John Chambers, o mesmo de “O Planeta dos Macacos”. Houve outro filme na mesma época citado pela mesma resenha, mas que não passou no Brasil, “Stanley, o réptil maligno”, que, por sua vez, tomava “posição contra os seus caçadores a serviço das fábricas que usam peles para fazer botas, bolsas e cintos”. Já o Alice Cooper... ah, o Alice Cooper estava alheio a tudo isso e só queria mesmo era tocar rock e beber cerveja, muita cerveja!...
E não é que além de o grande front man usar uma cobra nos shows, ele veio ao Brasil com uma bota salto plataforma e de cano longo feita de couro de cobra! Inclusive, cita-se que a Rita Cadillac, chacrete do programa "A Buzina do Chacrinha", sentiu uma tremenda inveja desta bota!... Aliás, não é de se descartar a hipótese de que sósias do cantor tenham ido ao programa do Velho Guerreiro e se sujeitado às suas buzinadas, fato que se deu com Ney Matogrosso após o sucesso – na verdade, não era nada fácil imitar estes dois grandes artistas da época. A bota de Alice ficou no Brasil e hoje se encontra em poder do baterista Paulo Zinner (da banda Golpe de Estado), que lhe foi presenteada por uma amiga que a ganhou do próprio Alice na época. Essa amiga, cita-se que era nada mais nada menos que a Rita Lee, que segundo o Paulo Zinner parece que também se apoderou do célebre ofídeo...
Sitiados pelo rock!
Março, março de 1974!... mês rockeiro quentíssimo como talvez nunca houve no Brasil! Em se falando de bandas brasucas, os Secos & Molhados haviam levado 20 mil fãs ao célebre show no Maracanãzinho no Rio de Janeiro, no entanto, uma cifra bem abaixo do show da Tia Alice no Palácio de Exposições do Anhembi. Na verdade, com a tremenda histeria causada pela passagem da banda no Brasil, o país viveria o seu auge do movimento rock na década de 1970. A revolução deflagrada pela passagem de Alice Cooper no país não teria precedentes.
Na verdade, estávamos “sitiados” pelo rock desde meados de 1973: de um lado era o Alice Cooper, após lançar “Billion Dollar Babies” em março; de outro eram os Secos e Molhados, com o primeiro LP lançado em 6 de agosto, e, no meio, o não menor Raul Seixas estreando carreira solo com o genial “Krig-Há Bandolo!”, o que se deu no memorável 21 de junho. Era muito para as nossas cabecinhas de pré-adolescentes! Vivíamos em transe, abestalhados – uma verdadeira revolução corria à solta pelo país!
O mês de março vinha para mostrar que o cenário rockeiro tinha mudado radicalmente no país. Já no mês seguinte estreava na Rede Globo o célebre programa Sábado Som; porém, o primeiro programa, apresentado pelo Nelson Motta, não foi com Tia Alice, mas sim com o Pink Floyd, com o célebre show ao vivo nas ruínas de Pompéia. Na verdade, houve um programa semelhante anterior na mesma emissora, apresentado pelo grande Big Boy, o “Hello Crazy People”, que estreou em 1º de julho de 1972, não durando muito, indo até o último sábado de dezembro deste mesmo ano, sempre aos sábados às 13:30 hs (e o que há de bom hoje em dia para se assistir num tedioso sábado à tarde na TV aberta?!). No programa do Motta, quem já tinha TV à cores se esbaldou com o Pink em meio as ruínas, e dizia-se na época que todos queriam ter TV à cores, mas os aparelhos eram ainda muito caros.
Curiosamente, na primeira apresentação realizada em São Paulo – o “show do tumulto” –, antes do início, a multidão enlouquecida que queria ficar perto do palco e ver o Alice Cooper de perto foi “acalmada” com o disco “Dark side of the moon”, recém lançado, que rolou nos alto-falantes por inteiro. Mas vocês devem estar intrigados se perguntando: “Por que Pink Floyd num show do Alice Cooper?!” Pois bem: acontece que Tia Alice chegou a morar por um curto período de tempo com o pessoal do Pink. Há uma história curiosa deste período: certa vez, instado sobre se transava drogas, Alice disse que a única vez foi quando comeu um bolo recheado de maconha numa festa nesta casa maluca onde moravam...
O fato mais engraçado sobre esse disco do Pink Floyd se deu com o obscuro jornal O Albatroz, que escreveu: “O mais novo lançamento do Pink Floyd não agradou: som muito abstrato, sem a necessária engrenação. Vamos ver o que os mágicos de ‘Dark side of the moon’ farão a seguir...” Coincidentemente, me recordo de ter lido numa matéria da época que quando este disco foi lançado primeiramente na Inglaterra, teve de ser incrementando com pôster e adesivos, ou seja, brindes “chamarizes”, já que o disco não estava “acontecendo”! Acho que foi na revista Pop que li isto, mas em junho de 1973, no Jornal da Tarde, o saudoso crítico Ezequiel Neves escrevera em sua coluna: “Sabedores de que a idade mental de seu público vem baixando assustadoramente, o Pink Floyd resolveu apelar de vez. Contratou os serviços da firma Hypgnosis, que encheu a edição original de "Dark Side of the Moon" de posters, adesivos e outras bossas. Já que a música era da pior qualidade, restava o consolo desses brinquedinhos”... Os tempos eram outros!...
Uma chamada profética no mesmo supracitado jornal O Albatroz dizia:
“Ecoam
pelo ar os últimos suspiros de disco inicial dos Secos e Molhados. Tomara que os
sujeitos não façam como muitas “revelações”: estoura, quebram os recordes e
depois, cadê?” (...) “E quanto às declarações de um jornalista carioca, o qual
afirma que caminhamos para uma nova invasão de música lixo, merece uma única
resposta: ‘Nos fios tensos da pauta de metal/As andorinhas gritam por falta de
uma clave de sol.’”
Ser cabeludo estava na moda, até no futebol!...
A banda de
Alice, muito provavelmente, foram os rockeiros de cabelos mais longos a pisar
no Brasil – até então ninguém havia visto jovens tão cabeludos em terras
tupiniquins, e com cabelos tão longos que chegavam a rivalizar com as próprias
mulheres. Na banda, destacavam-se os cabelos do baterista Neal Smith e do baixista Dennis Dunaway que se
estendiam quase até a cintura! E vale lembrar que os Cooper vieram numa época em que
no Brasil ser cabeludo era sinônimo de bandido – e a Rita não me deixa mentir,
pois poucos anos depois cantou o famoso refrão: “rockeiro brasileiro sempre teve
cara de bandido”. Ser cabeludo era sinônimo também de ser maconheiro, sujo,
hippie e piolhento, e a polícia da época – excessivamente repressiva devida ao
regime militar –, costumava não dar sossego para os cultores das longas
madeixas.
E a moda não se
resumia só os cabelos, pois os jogadores também usavam tamanco, costeletas
(suíças), barba cerrada, colares e pulseiras, roupas extravagantes, shorts
curtos, raiban B & L, etc., de modo que não havia técnico que não sentisse
um certo mal-estar...
O mais curioso é que a moda rock acabou influenciando até mesmo os jogadores de futebol, muito embora a maioria deles fosse composta de gente que curtia samba, aliás, como é até hoje: a velha fórmula samba + futebol!... E, ironicamente, também houve repressão para a turma da pelota, no entanto, não era a polícia que vivia em seu encalço, mas sim os próprios técnicos dos times.
Um exemplo marcante de jogador que cultivava longas madeixas foi o então centroavante do São Paulo, o jovem Muricy Ramalho (hoje técnico), que em 1974, com 16-17 anos, curtia a moda hippie e usava cabelos compridos, tamanco e bolsa tiracolo. O técnico José Poy pegava no seu pé, mas ele dizia não ser rebelde. Na verdade, desde o início ano anterior o fato já vinha causando incômodo, e era noticiada não só nos jornais, como também nas revistas e nas TVS.
Dentre outros futebolistas cabeludos famosos estavam o Rivelino e o Clodoaldo (ambos da Seleção), Forlan (São Paulo), e o Cesar (Palmeiras) e o Paulo Cézar “Caju” (Flamengo), que cultivavam enormes black powers que deram o que falar. O Afonsinho (Flamengo) – que além de cabeludo era barbudo –, era um caso à parte e deu o maior ibope na época, e chegou mesmo a ser cassado por suas escolhas não serem do agrado de generais e técnicos do período. Além de jogador era médico, músico e... boêmio. Um que “fez tipo” foi o polêmico César do Palmeiras – talvez o maior enfant terrible da história de nosso futebol. Foi ele um dos poucos que bateram de frente com os técnicos e chegou a chamá-los de “quadrados” e “invejosos da velha guarda”!... Já o Forlan, por sua vez, disse: “Futebol se joga com os pés e não com os cabelos”...
Um dos técnicos que mais atazanaram os jogadores cabeludos foi o Pepe do Santos, que obrigou o time todo a cortar os cabelos, e deixou muitos deles contrariados, embora a qualidade do futebol se mantivesse a mesma... O irônico da situação é que ele chegou a dizer na época que seu time “mais parece um bando de hippies”!...
Na verdade, nem as costeletas do Carlos Alberto (Seleção) nem os tamancos do Orlando (Sport Club) influiram na qualidade de seu futebol, e a teoria capilar do Forlan de que em futebol ninguém vira Sansão com os cabelos cortados, era mais verídica do que nunca...
Rock versus samba?
Curiosamente, mesmo jamais havendo um ano rockeiro assim no Brasil, dois anos depois - e o rock ainda em alta - , um sambinha de gosto duvidoso cantado pelo cantor Franco (pai dos KLB...), o medíocre “Samba enredo”, vaticinava: “Andam dizendo por aí que o samba vai acabar (...) Que o negócio é rock, e o negócio é rock, e o negócio é rock, irmão!”...
Na verdade, este ingênuo sambinha com sua “perspectiva assustadora” fora lançado numa época em que o samba teria uma reinjeção de vitalidade através da trindade Clara Nunes, Beth Carvalho e Alcione, iniciada antes com Martinho da Vila. Clara Nunes; no entanto, não aceitava o rótulo de “cantora de samba”, mas Alcione – talvez a responsável pelo lamento do Franco –, gravaria no ano seguinte, em seu primeiro LP, o lamentoso samba “Não deixe o samba morrer”, que, por sinal, fez um grande sucesso em todo o país e fez o “samba descer o morro” de vez. Apesar do conteúdo “à favor” do rock do sambinha do Franco, os rockeiros espumavam de raiva quando ouviam esta música, e a primeira providência era mudar de estação ou mesmo desligar o rádio o mais rápido possível.
Por outro lado, ironicamente, houve muito rockeiro que estava curtindo adoidado o novo hit do Gilberto Gil que explodia nas rádios, o belíssimo “Maracatu Atômico”, que no fundo era um samba sutil e muito estilizado. Para ser mais preciso, muitos rockeiros vinham curtindo samba desde o aparecimento dos Novos Baianos, e vale lembrar que no ano anterior a banda havia explodido nas paradas com uma releitura rock de um clássico do samba que dizia nada mais nada menos que: “Quem não gosta de samba/ Bom sujeito não é/ É ruim da cabeça/ Ou é doente do pé”...
Na ala masculina dos sambistas propriamente ditos, capitaneando o então “samba jóia”, despontava o pianista e cantor Benito de Paula, com seu primeiro grande sucesso, o samba canção “Retalhos de cetim”, e novamente a galera rock torcia o nariz quando o ouvia. Anos depois, este sambista amargaria um congelamento do público, o que se deu após o escritor Marcelo Rubens Paiva ter dito em sua biografia “Feliz Ano Velho” (1982), que o cantor era alienado e cantava a alegria e sambas de amor derramado numa época “barra pesada” em que a ditadura vivia apavorando os artistas. Marcelo, porém, é que era o alienado, pois não só ignorava que o cantor teve seu primeiro disco, de 1971, censurado por ter gravado “Apesar de você” de Chico Buarque (numa época em que uma de cada três músicas sua era liberada pela censura), como também desconhecia que Benito gravara, em 1974, uma música de sua autoria em que homenageava nada mais nada menos que Geraldo Vandré – a canção “Tributo A Um Rei Esquecido”, cuja letra, porém, não condiz com a realidade dos fatos.
O polêmico show do Anhembi, por
pouco não se torna uma tragédia!
pouco não se torna uma tragédia!
A mídia também – seja a televisão e as rádios, seja os jornais e revistas –, todos se rendiam ao fenômeno do rock e, na onda, lançavam novos programas, reportagens e colunas dedicadas exclusivamente ao gênero, como, p. Ex., a Folha de São Paulo, que encabeçada pelo crítico musical Edvaldo Gouvêa, lançava a ótima coluna “Rock”, que fazia um apanhado geral dos shows correntes no país, dos discos lançados na semana e também notícias sobre artistas no estrangeiro, que era publicada no caderno Ilustrada, às segunda-feiras.
Voltando ao Alice Cooper, em Araras, como já disse, repercutiu bastante o tumulto causado no Anhembi pelos fãs, e era assunto de cabeceira entre as rodas de rockeiros. Na verdade, ninguém no país estava preparado para um show desta envergadura: imprensa, público, empresários, segurança, assistência médica, setores de alimentação, etc., todos eram de um despreparo tão gritante, que por pouco o show não resultou em tragédia. Os fãs enlouquecidos queriam de todas as maneiras se aproximar do palco para ver Alice de perto, que acabaram por esmagar contra a grade de segurança os jovens estava à sua frente! O show teve que dar um tempo e enquanto a histeria não cessou a banda não retornou ao palco.
Houve cerca de 200 feridos, mas sem gravidade. Felizmente, acalmados os ânimos com as constantes “chamadas” nos microfones, o show continuou com todos ironicamente sentados pelo chão... Na verdade, a primeira entrevista com a imprensa já era um indício de que poderia mesmo haver tumulto e histeria: quando a banda deixou a primeira coletiva, dezenas de jovens foram correndo atrás da banda, que procurou se safar “fugindo” num Galaxy vermelho que atravessou o centro de São Paulo à toda!...
Aproveitando o sucesso de Alice Cooper no Brasil, a gravadora Warner lançava, com atraso de anos, o disco “Love it to Death”, que, segundo o jornal Folha de São Paulo de 22 de abril, foi produzido por Jack Nicholson, e não Jack Richardson! E pensar que o ator Jack Nicholson não passou de “Easy Rider”!...
Muitas bandas sondadas, e nenhuma vinha!...
Outras bandas estrangeiras estavam na mira dos empresários. Foram cotados Paul MacCartney & Wings, Pink Floyd, Black Oak Arkansas, Rolling Stones, Led Zeppelin (show que seria aberto pelo O Peso) e The Who, porém, infelizmente (para ambas as partes) ninguém veio!.. A única banda que realmente esteve mais próxima de vir foi o Traffic, que, inclusive, já tinha até data marcada, mas os shows foram abortados porque a banda encerrou as atividades logo depois. Quem acabou vindo, pela segunda vez, em maio, foi o cantor grego Demis Rousseau, que, aliás, era oriundo de uma banda de rock, a Aphrodite’s Child. Rousseau, numa entrevista ao jornal da revista Pop, confundindo alhos com bugalhos e cuspindo em seu passado rockeiro, aproveitou para descer a lenha na trindade Alice Cooper, David Bowie & Mick Jagger, quando criticou “(...) nunca vou assistir a um show desses. Eu detesto os andróginos”. Por sua vez, o terno Billy Paul, que havia vindo em abril, instado sobre o mesmo assunto, foi mais cortês e confessou: “É realmente uma música diferente. Eu sou muito aberto, aceito quase tudo sem me grilar”.
Em novembro, outra notícia “auspiciosa” mexia a cabeça da galera: a revista Pop anunciava a vinda do Black Sabbath ao Brasil, e foi o maior rebuliço – a empresa Kep, que trouxe o Jackson Five em setembro, era a responsável pelo contrato, mas, para a frustração geral, infelizmente nada aconteceu. A mesma cogitou também da vinda do Focus, do King Crimson e do Deep Purple, mas tudo não passou também da promessa. E ressalte-se que mesmo com o Alice Cooper falando mil maravilhas do Brasil em sua volta aos EUA, de seu público numeroso e ensandecido, as bandas pareciam não querer arriscar a baixar no país... Ele disse à época: “Vocês precisam ir à São Paulo, é inacreditável!”
Curiosamente, em março havia desembarcado no Brasil um outro astro do rock, mas ele passou despercebido da mídia: era nada mais nada menos que Mick Taylor – àquela altura ex-Stones –, que vinha curtir uma longa “férias” no Rio de Janeiro e conhecer o tal do “maior show da terra”, o Carnaval. Logo que chegou ao aeroporto do Galeão, às 6 e meia da manhã, não queria acreditar que ainda era tão cedo, e a claridade solar era tanta que ele teve de usar óculos escuros. Aproveitando o ensejo, conheceu vários estados, incluindo Mato Grosso e Amazonas, e foi embora com uma fatal certeza: a de que a nossa música é “um negócio incrível e supercontagiante”. E não fora só o Mick Taylor que ficou curioso para conhecer a Amazônia: quando a banda do Alice Cooper deixou o país, o guitarrista Glen Buxton – “o coração e a alma da banda” – não partiu junto, e ficou por mais de uma semana veraneando naquelas selvagens paragens, e sem dar sinais de si!... A revista poeira Zine, que por sinal documentou toda a passagem da banda pelo Brasil, escreveu sobre o episódio:
“A banda inteira
voltou para casa no dia 8 de abril, exceto o guitarrista Glen Buxton, que foi
se aventurar na floresta amazônica. O cara sumiu por seis semanas e não deu
nenhum sinal de vida para familiares e companheiros de banda. A equipe de
Alice já começava a se preocupar com o sumiço do músico, até que num belo dia
Glen desembarca em Nova Iorque como se nada tivesse acontecido!”
Quase dois anos, e um novo grande show!
Finalmente, o vazio de shows de rock com artistas internacionais fora preenchido no ano seguinte, com a vinda de outro artista que explodia nas paradas brasileiras na época: Rick Wakeman, considerado pela imprensa brasileira “o novo ídolo do rock”. E, por parível que increça, a responsável por sua vinda era a Rede Globo, que, inclusive, vinha com freqüência fazendo vinhetas de seus programas usando músicas do tecladista. Na verdade, a Globo pretendia trazer o Yes, mas os custos se mostraram astronômicos. Eu eu já vinha delirando com o Yes desde junho deste ano, quando comprei o marcante disco “Fragile”, além de já ter em mãos um exemplar da revista Rock, a História e Glória, lançada em abril de 1974, que contava com minúcias a história da banda, revista que muito marcou a minha vida e me levou a ser vegetariano aos 16 anos – era um vegetariano chinfrim, muito mal informado, mas seria o começo de uma mudança alimentar radical que, graças à Deus, acompanha minha vida até hoje.
Mas, para compensar a nova frustração de não poder ver o Yes, uma pesquisa havia revelado que o Brasil era o terceiro maior consumidor dos discos solo de Wakeman, e, para a nossa suprema felicidade, o tecladista estava em apuros financeiros devido ao fiasco de sua excursão pelos EUA. E eu já vinha acompanhando desde setembro o sucesso de Rick Wakeman com o ótimo “Viagem ao Centro da Terra”, que fez um enorme sucesso no Brasil. E, além disso, uma reportagem publicada numa Pop de novembro de 1974 já me havia tirado dos eixos – eu via aquelas fotos, aquele aparato todo e ficava delirando!... E depois, o disco em mãos, aquele álbum caprichado, aquelas músicas!... sem comentários!...
E, então, encerrando o Projeto Aquarius de 1975, o mago dos teclados desembarcava no país para uma série de cinco shows no mês de dezembro, shows estes que foram suficientemente documentados pela citada Pop e a própria televisão. Ligar a TV e ver Wakeman com aquele cabelão e sua capa dourada rodeado de mil teclados, fora um impacto em minha vida tão grande quanto ao de Alice Cooper e seu “circo de horrores”!
Recordando destes dias incríveis, constato o quanto estas coisas mexeram comigo! Aliás, mexeu com a vida dos jovens rockeiros de todo o Brasil – a coisa era quase que um fenômeno, por todas estas novidades despejadas no país, primeiro por Alice e depois por Wakeman! Cita-se sobre este que a capa completamente cobertas de lantejoulas e sua imensa cabeleira loira brilhavam tanto que o tecladista mais parecia um fantástico vulto de luz pairando sobre o palco! Tanto o é que a revista Pop de dezembro presenteava os leitores com um pôster gigante do tecladista, e com muitas reportagens no verso, que marcou época e até hoje é lembrado, sendo ele uma verdadeira relíquia.
Alice ator!
No mesmo mês que comecei a trabalhar em meu primeiro emprego, no que fui obrigado a me mudar para a cidade, poucos dias antes, em julho de 1976, algum canal de TV anunciou que iria ao ar um capítulo de uma nova minissérie televisiva, a “The Snoop Sisters” que, no entanto, havia ido ao ar anos antes nos EUA, e 5 de março de 1974. O episódio era “The Devil Made Me Do It” (A Culpa foi do Demônio), e, para minha grande alegria, haveria uma participação especial do Alice Cooper! No episódio, o Alice Cooper, atuando sob o nome de Prince, mas sem participação da banda, cantou a música “Sick Things”, do disco “Billion Dollar Babies”, e foi uma interpretação dramática, pois, além de ficar brandindo uma foice acima da cabeça, ele usava uma impactante roupa preta com o desenho de um esqueleto, simulando uma caveira, e eu fiquei chapado ao vê-lo vestido assim.
No mesmo dia, emprestei a máquina Kapsa de meu amigo Marcelo Aragão, e com ela fiz uma foto dele na TV, pois, além do louco visual do Alice Cooper, havia notado que no cenário havia um painel atrás dele com uma foto bastante interessante dele mesmo, numa pose com um olhar meio a la Che Guevara. A foto remontou duas imagens, mas, mesmo assim, pode ser aproveitada, e através dela pude refazer a imagem do painel num desenho, que depois resultou numa estampa de uma camiseta que usei por um bom tempo, e que deixou muito rockeirinho da cidade cheio de inveja – afinal, só eu tinha aquela imagem inédita do Alice Cooper! Para ampliar a imagem da foto, usei o método de quadriculação, que havia aprendido com o professor Toninho Rodini em suas aulas de desenho.
No ano seguinte, emprestei este desenho para meu amigo Paulão Juviliano, e cópias dele rodaram meia Araras de mão em mão; e, depois, para meu orgulho, vi muito rockeiro pela cidade usando camisetas pintadas com esta imagem, que eu tinha certeza que viera deste meu desenho. Sobre este, um dia fui até a casa do Paulão e, para minha surpresa, e ele me devolveu o original, isto, mais de 30 anos depois de eu tê-lo emprestado, desenho este que, hoje, guardo-o como um tesouro dos meus sonhos de menino!
Por esta época, por estar morando novamente na cidade e me encontrar afastado dos jornais televisivos, me escapara o anúncio da descoberta de uma montanha na superfície de Marte cuja aparência lembrava um rosto humano, imagem que causou grande impacto, tanto quanto a carantonha do Alice Cooper pintado de cobra!... A impressionante fotografia foi feita no dia em 25 de julho de 1976 pela nave Viking 1, e causara um verdadeiro rebuliço, principalmente nos meios ufológicos, e até hoje a descoberta é motivo de polêmica entre cientistas e ufólogos. Era a segunda perda que eu tivera neste ano, pois em março, como já o disse aqui, lamentavelmente, me escapara a belíssima aparição do cometa West (foto), do qual eu não tive a mínima notícia! Mesmo observando o céu com a mesma constância de sempre, o belíssimo astro passou às escondidas de mim!...
E a banda se desfez!
O ano anterior havia seguido com outras novidades incríveis, e nesse mesmo mês de julho, adquiri na então Loja Tupinambá o novo disco do Alice Cooper, o “Welcome to My Nightmare”, um bom disco, reconheça-se, mas já não era o som que caracterizava a grande banda original. Quando a revista POP lançou um dos seus compactos duplos em 1975, trazendo "Some Folks" - uma das canções deste disco -, eu torci o nariz porque não era o "rockão pesado" que eu esperava, mas, mesmo assim, curti a música, que, coincidentemente, foi composta durante a turnê no Brasil.
No entanto, seu sucesso se mantinha no Brasil, tanto o é que em 13 de dezembro de 1976 estreava na Rede Globo a novela “Duas vidas”, e, surpreendentemente, a primeira música do lado A do disco seguinte, lançado em fevereiro de 1977, o mediano “Goes to Hell”, era “I Never Cry”, que galgou as paradas do país. Esse disco, porém, eu só fui adquiri-lo em outubro seguinte numa loja de discos da rodoviária em Campinas, mas, repito, já não era mais o Alice Cooper com a banda original que eu tanto gostava, além disso, ele havia abandonado a célebre pintura, aquela pintura incrível que tanto havia mexido com a imaginação minha, de meu irmão e de todos os seus fãs no Brasil. Sim, as coisas tinham mudado radicalmente no cenário rock, e para corroborar isto, neste mesmo dia, na mesma rodoviária, eu comprei na banca ali existente um exemplar do Jornal de Música, e uma das principais reportagens era sobre o movimento Punk que começava a assaltar o Brasil, e, não sei como, eu embarquei de cabeça nele.
Com o resto de minha família retornando à nossa casa original na cidade em março de 1977, minhas relações com a Usina seriam rompidas para sempre, com alguma visita esporádica ou outra. Ficava para trás a terra que eu amei mais que tudo, e com ela, aquela banda genial que nunca mais haveria de se reunir novamente para minha grande frustração!
Resquícios da “Alicemania” surgiram ainda mais uma vez em minha vida, o que se deu em fevereiro de 1978, quando fui ao carnaval da A. A. A. trajado de punk, mas, ironicamente, com a cara pintada de Alice Cooper!... isto, quando o próprio Alice já se apresentava sem pintura!...
* * *
Nossas lembranças dos nossos primeiros contatos com a música de Alice Cooper e sua figura são incríveis – aquele sentimento todo, a enorme euforia. Aqueles momentos saudosos de nossa meninice rockeira, que curtimos sonhando em fazer o que fizemos poucos anos depois, ou seja, formar uma banda de rock, foram para lá de especiais e excitantes. Apesar de nossos caminhos terem tomado rumos diferentes depois, hoje, quando nos reencontramos, sorrimos relembrando o que tudo aquilo nos causou, as transformações, os sonhos, as esperanças... Em ambos estamos em total consonância que não mudaríamos nada daquilo que aconteceu, e que será eterno!
* Este capítulo faz parte da série de nove livros memoriais sobre a Usina Palmeiras: "O MENINO DA USINA". Vol. 5 – The way we were – abril de 1973 a de dezembro de 1974. Os livros estão em processo de confecção sem prazo para lançamento.