sexta-feira, 24 de abril de 2015

O CARINHO DO BRASILEIRO NO USO DOS PRONOMES DE TRATAMENTO POSSESSIVO


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A poeta norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979), reconhecida entre as escritoras mais importantes do século XX da Língua Inglesa, escreveu boa parte de sua obra no Brasil, onde morou entre 1951 e 1967. 

Elizabeth apreciava muito nosso idioma, que dizia ser "cheio de diminutivos, aumentativos, formas carinhosas etc.”. Sua palavra predileta em português era "coitado", “uma das primeiras e mais úteis palavras que um estrangeiro aprende”. Em um de seus comentários mais famosos, observou ironicamente o uso que o brasileiro faz dos pronomes de tratamento possessivo ao lidar no dia-a-dia com as pessoas:


"— Aqui você chega e o zelador, o porteiro, o cozinheiro abraçam você com carinho e a chamam de 'senhora' e 'minha filha' ao mesmo tempo!...



   

No conto “Pílades e Orestes”, Machado de Assis, se refere à um caso algo também semelhante:

“Chamava à filha 'a minha alemãzinha', apelido que foi adotado por Quintanilha apenas modificado para o plural: “a nossa alemãzinha”. Pronomes possessivos dão intimidade; dentro em pouco, ela existia entre os três, — ou quatro, se contarmos Gonçalves, que ali foi apresentado pelo amigo; — mas fiquemos nos três.”





Fato algo semelhante se deu séculos antes, mas desta vez com um menino, também não brasileiro, mas português, que viria a ser também literato muito famoso quando adulto. Me refiro ao célebre Padre Viera (1608-1697), aliás, um dos maiores escritores da Língua Portuguesa. No texto a seguir  uma passagem real de sua vida  há indícios de que esta forma de tratamento há muito já era vigente em terras lusitanas:

“Em Lisboa, Vieira teria no máximo seis anos, por que veio ao Brasil em 1614, perguntou-lhe um cônego, no adro da antiga Sé de Lisboa: 

— De quem sois, meu menino? 

— Sou de Vossa Mercê, pois que me chama seu.


Outro que se refere ao assunto é o escritor Pedro Nava (1903-1894), em seu livro "Galo das Trevas" (1981). Em determinado trecho deste livro de memórias, lê-se:

“Baixou os ouvidos sobre as regiões de baixo da clavícula. Em ambos os pontos ele sentiu como vento dum furacão ao longe — o sopro cavernoso. 
— Agora deita de lad'um pouco, minha filha, primeiro, lado direito, depois esquerdo, pr'eu escutar tuas costas. 
O minha filha dito com extrema doçura não atritou os ouvidos suspicazes da Conceição porque esse minha filha era o tratamento dos médicos com todas as doentes. Automático. Só que o Egon o dizia com uma doçura de coração amante paterno. Repetindo por gosto.


Uma cinquentenária reportagem sobre o cais da cidade paulista de Santos, publicada na extinta revista Realidade, de setembro de 1968, onde comenta a "rivalidade" entre prostitutas santistas e cariocas, traz uma curiosidade:


“E as cariocas são as mulheres mais alegres. Defendem-se em espanhol, inglês e alemão. Chamam:
— Shotime, Faive dolar. Ten Táuse.
Tratam o gringo com classe. São educadas, carinham.
— Filhinho, meu filhinho."




Pedro Bloch (1914-2004) um médico foniatra, jornalista, compositor, poeta, dramaturgo e autor de livros infanto-juvenis, numa de suas obras recolheu esta história ocorrida com a filha de um amigo seu, e é provável que se trate da atriz Regina Casé: 
 

“Um preto velho, muito feio, pediu a um pirralho:


- Meu bichin, vai vê um caneco d'água pr’eu bebê!

- ‘Meu bichinho’ não, eu não sou bicho.!

 Ó xente! Não se zangue não, meu filho Taís pontos

- ‘Meu filho’ Não que, se eu fosse seu filho, era bicho.

"CRIANÇA FALANDO DIFÍCIL
O meu amigo Casé tem uma filhinha que, desde que tinha este tamanhinho assim, já era incrível.
Tem saídas prodigiosas, tão prodigiosas que muitos dos amigos mais íntimos só acreditavam vendo e ouvindo. 
Certo dia começou a usar a palavra 'autêntico'. Era 'autêntico' pra cá, 'autêntico' pra lá. 'Autêntico' isso, 'autêntico' aquilo. 
Foi quando alguém, vendo-a gastar palavra tão difícil para tão fácil idade, observou:
 — Que negócio é esse, menina? Deixe disso! Você não sabe o que é autêntico! 
— Sei, sim! — protestou o pingo de gente. 
— Não sabe, minha filha! — insiste a visita. 
E a garotinha explica pra liquidar o assunto:
— Quer ver: quando a senhora me chama de 'minha filha' não é autêntico. Agora, quando mamãe diz 'minha filha' é autêntico."



Um caso muito engraçado envolvendo este assunto foi recolhido pelo escritor Leonardo Mota em seu livro "No Tempo de Lampião! (1968):

 

“Um preto velho, muito feio, pediu a um pirralho:


- Meu bichin, vai vê um caneco d'água pr’eu bebê!

- ‘Meu bichinho’ não, eu não sou bicho.!

- Ó xente! Não se zangue não, meu filho!...

- ‘Meu filho’ Não que, se eu fosse seu filho, era bicho.




Hoje, no Brasil, está na moda, mesmo entre homens, a expressão “querido”, que a usam como forma de carinho, respeito e bem-querer em qualquer situação. Curiosamente, nos tempos do escritor Charles Dickens (1812-1870), certa vez, num jantar, sentado ao lado da jovem mulher de um famoso médico americano, Dickens ouviu-a dirigir-se carinhosamente ao marido chamando-o por “querido”, e consta que esta expressão era inusitada na época. Dickens achou tanta graça nisto, que desatou a rir até cair da cadeira, esparramando-se no chão, com os demais convidados tendo apenas uma visão dos seus pés agitantes no acesso de riso incontrolável.

A esta altura, não nos esqueçamos daquela velha mania nossa de que quando queremos enfatizar ou engrandecer alguma atitude, como, p. ex., o ato de se dar um belo golpe numa pessoa, dizermos: “Uma senhora cacetada!”  Mas, vamos a um exemplo dessa expressão, em que o substantivo “senhora” temum uso inusitado, funcionando como uma espécie de adjetivo aumentativo. O trecho abaixo foi extraído do conto “A consulta do Lau”, do livro “Leréias: Histórias contadas por eles mesmo” (1945), do escritor regionalista Valdomiro Silveira (1873-1941b):
 

“─ O home’, Lau, é dos bons. E tem uma senhora filha, Eita menina placiana e conversada!” ”


Num curioso trecho de uma reportagem extraída de um exemplar da revista Playboy, de novembro de 1989, onde o articulista expõe regras de etiqueta, ele diz que a expressão "minha senhora" soa pesada, alegando que "há muito tempo elas preferem ser chamadas de senhora".

Alguém também já escreveu que a interjeição tão comum em nossas bocas, a tal de "minha nossa!", é frase nascida de algum bipolar... Reconheça-se: bem típico de nosso povo. Fazer o quê, brasileiro é assim mesmo, "tá ruim, mas tá bom"...


FONTES:
Contatar o autor.
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domingo, 5 de abril de 2015

"O CRISTO MAIS CONHECIDO DE TODOS OS TEMPOS"!


Robert Powell, no papel de Jesus Cristo, no célebre filme que você reassiste todo ano, o "Jesus Cristo de Nazareth", de Franco Zefirelli, lançado na Páscoa de 1977.  Na verdade o filme veio de uma minissérie feitas para as TVs inglesas e italiana, com duração total de cerca de 6 horas.


Cita-se que  Powell foi escolhido a dedo, porque Zeffirelli queria um ator igual às imagens do Vaticano. Se diz que o fato de o diretor transformar visualmente o seu Jesus em uma espécie de Apolo não é tão questionável assim. Um artista eclético como fora Leonardo da Vinci, ao ser indagado sobre o motivo de seu Cristo na Santa Ceia ser quase loiro, respondeu que, a partir de aprofundadas pesquisas, seu Cristo era o mais próximo do verdadeiro Jesus. 

O Cristo interpretado por ele, desde então, se tornou uma imagem muitas vezes usada na arte devocional popular, e seu papel se tornou tão forte e emblemático que a imagem que as pessoas do mundo todo tem em mente quando pensam em Jesus Cristo é a sua. 

O mais curioso é que Powell quase nunca pisca ao longo de todo o filme, e quando interpretou o papel, tinha a mesma idade de Jesus, ou seja 33 anos. 

Powell, sem dúvida, trouxe para o cinema o retrato definitivo de Jesus. Antes de sua performance apaixonada e perfeita, havia poucos casos em que Cristo tinha sido visto e marcado tanto - é como se a tela estivesse aguardando o homem certo para o papel certo. Powell é perfeito - dizem ainda hoje! Com isto, o Cristo de Powell se tornou O mais conhecido de todos os tempos, o que não é pouco!