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sexta-feira, 12 de setembro de 2008

GARIBALDI INVADE ARARAS!

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O leitor talvez estranhe esse enunciado, mas é a mais pura realidade: o Garibaldi está mesmo invadindo a cidade! E ele vêm em bandos numerosos, vem fazendo alarde, invadem as ruas e as praças, muito embora há os que não percebam essa invasão... Houve pelos menos um observador, que, à serviço das causas ambientais, munido de um binóculo, ao se deparar com o bando ao longe, constatou: “– Sim, olha lá: é mesmo o tal do Garibaldi!!”: este que isto vos escreve...

Não, leitor, eu não estou delirando nem afirmando que o legendário Giuseppe Garibaldi ressuscitou e está invadindo a cidade. Não, eu não me refiro ao herói da Guerra de Farrapos – o mesmo da minissérie da Globo, personagem tão homenageado em Araras nos tempos da extinta colônia italiana “Società Independente Progressista Umanitária”. Eu explico.

Neste mesmo blog, em matéria semelhante, eu alertarei sobre uma nova espécie de ave – a Lavadeira-mascarada (Fluvicola nengeta) –, que se instalou nos jardins da praça Barão pela primeira vez, o que se deu no ano de 2003. Chamava a atenção o fato, pois é ave exclusiva de ambientes aquáticos. Em fevereiro de 2008, em socozinho (Butorides striatus) foi visto na fonte d’água em frente à banca de jornais do Orpinelli.

Agora, há algo mais no ar além da chuva de carvão particulado das queimadas. Coisa de pouco mais de dois anos, numa verdadeira invasão, uma nova espécie de ave chegava à zona urbana – o Garibaldi (Agelaius ruficapillus), ave muito popular entre os que costumam fazer pescarias próximos à brejais e alagadiços, também conhecido como Do-re-mi. Tal como a Lavadeira, o Garibaldi também vive em wetlands (áreas alagadas), mais especificamente no meio de taboais. Surpreendentemente, na praça Barão, p. ex., eles não costumam ficar na vegetação da fonte nem nos dois lagos, mas sim no alto das árvores, onde chamam a atenção por cantarem constantemente, e com um canto bem atrativo, possuindo um chiado característico. Na verdade, os bandos estão sendo vistos em todas as praças da região central, e até mesmo nos arvoredos de ruas e residências, isto, sem o mesmo retraimento de quando estão nos brejais, pois ficam marinhando despreocupadamente pela ramaria das árvores, e sequer se assustam com o trânsito e as pessoas, o que é notável para uma ave que em seu habitat original é arredia. Eles surgem na região central da cidade em agosto ficando, ao que parece, até outubro.


Este é mais um dos chamados casos de sinantropia envolvendo pássaros, ou seja, o de espécies que conseguem freqüentar a zona urbana ou mesmo se adaptar sem grandes dificuldades a um ambiente diferente do seu. No entanto, ao contrário da Lavadeira, o Garibaldi não se instalou e nem procria na zona urbana, mas apenas a freqüenta diuturnamente quando lhe dá na veneta. Não podemos afirmar, por enquanto, que, como a Lavadeira, o Garibaldi tenha alguma estratégia para vir a sobreviver um dia neste novo ambiente, mas, por viver nos brejais, talvez não encontre um refúgio similar na zona urbana onde possa se fixar.


Curiosamente, existe ainda uma outra ave da mesma família que habita os brejais – o Chopim-do-brejo (Pseudoleistes guirahuro) –, que vem sendo visto freqüentando os canaviais. Quem vai ou vem de Rio Claro, poderá vê-los às vezes sobrevoando as plantações, ou pousados nas fiações elétricas que marginam a rodovia. Um dia, num final de tarde, tive a impressão que um bando deles adentraram um canavial para pernoitar. E eu pergunto, qual o motivo de o Chopim-do-brejo estar sendo visto nos canaviais? Mais adiante eu sugiro algumas pistas.


À primeira vista, o Garibaldi pode lembrar o popular Chopim (Molothrus bonariensis), ave de plumagem negra e da mesma família, mas o que o distingue é a cor ferrugínea do alto da cabeça, garganta e peito (foto). A fêmea é de cor pardo-olivácea, garganta amarelada e o corpo todo estriado. Quando em grandes brejais, forma bandos de centenas de indivíduos, tornando-se a espécie mais numerosa ali. São pássaros alegres e notáveis cantores, possuindo voz estridente e chamativa, é a que mais se destaca neste ambiente. Alguém poderia perguntar: “– Por que o nome Garibaldi? Veio do Giuseppe seu nome?” Os dicionários afirmam que Garibaldi é o nome de um casaco curto de mulher ou blusa vermelha que se veste exteriormente, o que nos remete às cores que adornam a parte frontal do Garibaldi


Um outro cidadão, mais romântico, poderia imaginar que, um belo dia de Primavera, algum exemplar extraviado passou pela praça Barão e achou-a atraente. Depois voltou aos taboais do lado Leste ou Oeste da cidade e avisou aos colegas da novidade, e, desde então, eles deixam os brejais e vêm visitar as praças e fazer um footing à sua maneira, cantando e passeando animados pelos arvoredos que sombreiam as alamedas. A Ornitologia afirma que ele é tem tendências nômades, aliás, Garibaldis tem sido vistos junto de bandos de Chopins. Na Central de Abastecimento se reúnem bandos que ali são alimentados pelos funcionários. Há também uma senhora na rua Dom Bosco, descendo o Oratório São Luís, que consegue atraí-los num comedouro em seu quintal, atitude que vem colaborar para a sua “fixação” na cidade. É provável que os Garibaldis tenham, de alguma forma, acompanhado os Chopins em suas incursões pela cidade, mas, a coisa pode não ser bem assim: se você leitor, está entre aqueles que não notou que o Garibaldi está mesmo invadindo Araras, é hora de não só afinar os ouvidos como também procurar se informar dos assuntos que dizem respeito à Ecologia, e saber que, é possível que, com o avanço galopante dos canaviais, aterros, dragagens de rios e a construção de represas e barragens, etc., o que implica na destruição dos pântanos, várzeas, banhados e brejais, isto talvez esteja obrigando, a contragosto, o Garibaldi e outras aves a invadirem a cidade.

As wetlands estão entre os ecossistemas mais férteis e produtivos do mundo. São habitats imprescindíveis para inúmeras espécies vegetais e animais, desempenhando importante papel na regularização dos ciclos hidrológicos, na filtragem da poluição, na reciclagem de nutrientes, etc. Enfim, sugiro à administração que é chegada a hora de deter o avanço humano sobre estes preciosos ecossistemas e criar-se medidas eficientes para conter sua destruição, como, p. ex., fazer um levantamento das wetlands e instituir incentivos fiscais aos particulares que as conservem. É o mínimo que se pode fazer para evitar desastres piores do que a aparentemente festiva invasão do Garibaldi a Araras. Ainda assim, nesta Primavera, não deixemos de dar nossas boas vindas ao animado Garibadi.

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BIBLIOGRAFIA

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