segunda-feira, 30 de março de 2009

ANDANÇAS DO POETA FAGUNDES VARELLA E ACONTECIMENTOS MARCANTES EM SUA VIDA

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Como venho escrevendo um romance biográfico sobre o poeta Fagundes Varella (1841-1875), para facilitar o meu trabalho, precisei fazer um roteiro que resumisse todos os acontecimentos marcantes em seu vida. Achei uma boa idéia disponibilizá-lo na Internet, para o usufruto de quem interessar possa. É provável que ele contenha erros, e se alguém descobrir algo, me avise.

Adianto que livro algum lançado sobre o Varella contém uma cronologia como essa, que vai a fundo em sua vida. A pesquisa foi feita em nove livros biográficos seus. Creio que ela será muito útil aos pesquisadores de sua vida, bem como fãs e curiosos.

À propósito, sobre o meu livro, ele se chama "O Romeiro da Maldição - As reinações do poeta Fagundes Varella", e pretendo, melhor, tenho que lançá-lo até o começo do ano que vem, no máximo até abril, para coincidir com o centenário do penúltimo e fenomenal aparecimento do cometa Halley, que é um dos assuntos do livro, que, à esta altura, já está ultrapassando 600 páginas.
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ANO
CRONOLOGIA BIOGRÁFICA DO POETA FAGUNDES VARELLA
1812
- Nascimento, à 27/11, do pai de Fagundes Varella, o doutor Emiliano Fagundes Varella.
1830
- 20-11, assassinato, em São Paulo, de Libero Badaró, que é socorrido pelo doutor Emiliano.
1841
- Rio Claro/RJ – Nascimento de Fagundes Varella em 17-8- 1841.
1851
- Viagem à Catalão-GO, com o pai, aos dez anos, onde conhece o escritor Bernardo Guimarães, então juiz municipal.
1853
- Em Angra dos Reis, Fagundes Varella inicia seus estudos primários com o professor Souza Lima.
1854
- O pai vai trabalhar Petrópolis/J, onde Fagundes estuda com Jacinto Augusto de Matos e José Cândido de Deus e Silva. Mora primeiro na baía de Ilha Grande, e depois na baía de Guanabara, onde, cita-se, residiu por dois anos.
- Em 30/4 é inaugurada a primeira estrada de ferro do Brasil que ia o porto de Mauá até Fragoso, perto de Raiz da Serra/RJ.
1855
- A família muda-se para Niterói/RJ.
- Fagundes prega uma peça em seu professor, o Dr. José Cândido – que lhe disse que nunca seria bom poeta –, quando se faz passar por Camões e o engana.
1859
- Desembarque em Santos-SP em 5/7 pelo vapor Piraí, de onde se dirige à São Paulo a fim de terminar os preparatórios para ingressar na Faculdade de Direito.
- Estréia como poeta no jornalzinho “Associação Recreio Instrutivo”, onde publica “O Vagalume” e “Vem!...,” esta endereçada à Ritinha Sorocabana.
- Falece o avô, Cel José Luís de Andrade, no 2º semestre.
1860
Em 27/5 publica seu primeiro artigo, “Drama Moderno”, na “Revista Dramática”, e artigos na “Revista da Associação Recreio Instrutivo”.
- Depois de um ano em São Paulo, visita o distrito de S. J. Príncipe, em Rio Claro, no Rio de Janeiro.
1861
Volta à São Paulo em janeiro.
- Publica em setembro uma ode à Independência denominada “7 de Setembro”.
- Neste mesmo mês publica “Palavras de um Louco” no “Associação Recreio Instrutivo”.
- Publicação dos folhetins “As Ruínas da Glória” e “A Guarida de Pedra”, e de poemas em homenagem aos atores Furtado Coelho, Eugênia Câmara e João Caetano, no jornal “Correio Paulistano”.
- Publica a poesia “Eugênia atriz Eugênia Câmara”, e, no dia 28, “Oração a Eugênia Infante Câmara.”
- Em outubro, o “Correio Paulistano” publica uma série de contos e poesias de Varella.
- Em 11/11 é anunciado em São Paulo a chegada do Circo Eqüestre e Ginástico Cia. Luande, do pai de Alice Luande, artista pela qual se apaixona.
- Em 12 /11 é lançado seu primeiro livro, “Noturnas”.
1862
- Matrícula na Faculdade de Direito de São Paulo.
- Vai para Rio Claro/RJ, para pedir permissão ao pai para se casar com Alice Luande.
- Em 15/4 desembarca em Santos com o vapor Pedro II na companhia de Alice.
- Vai para São Paulo e, passando por Cotia e São Roque, vai para Sorocaba, onde se apresentava o Circo Luande.
- Em 7 de maio o pai escreve a Varella advertindo-o dos perigos de um casamento precipitado.
- Em Sorocaba, em 28/6/1862, casa-se com Alice.
- As famosas feiras de muares de Sorocaba ocorriam de meados de abril até meados de junho, mas este ano fora um fiasco devido à peste dos cafezais que fez com que os mercadores não aparecessem à cidade.
- Varella segue com pelo interior de São Paulo como atração do circo do circo Luande, onde declamava suas poesias, se apresentando em Santa Rita, Itu, Porto Feliz, Tietê e Rio Claro.
- Em outubro o circo volta para São Paulo, onde, no dia 12, morre a mãe de Alice.
1863
- No começo do ano é processado por injúria.
- Em maio é despejado de sua casa numa chácara no Brás/SP, situada atrás da igreja Senhor Bom Jesus.
- Livro “Vozes da América” lançado em 13 de setembro.
- 4/9 nasce seu primeiro filho, Emiliano.
- Em 18/10 é processado, e refugia-se longe da mulher em repúblicas de amigos. É preso por dívidas comerciais em 21/10/1963 em São Paulo.
- 11/12 morre Emiliano, e Varella compõe a célebre poesia elegíaca “Cântico do Calvário” dedicada ao filho morto.
- Dezembro: mês em que se creditou a Varella o famoso acróstico “O bobo do Rei faz anos”, uma “homenagem” ao aniversário de Dom Pedro II. Parte com Alice para Rio Claro/RJ, em férias de verão.
1864
- Em 14/3 desembarca com Alice em Santos pelo vapor Santa Maria.
- Em 6/9 é lançado “Vozes da América” (com “Cântico do Calvário”), mesmo mês em que é apresentada sua desaparecida peça de teatro “39 Pontos”, pelo ator Lopes Cardoso no teatro São José.
- Serviços avulsos de escrevente de cartório.
- Em dezembro, não presta os exames da Faculdade e retorna com Alice para a fazenda Santa Rita em Rio Claro/RJ.
- Alice dá os primeiros sinais da doença, e Varella diz que vai estudar o 3º ano em Recife.
1865
- Parte no vapor Béarn do Rio de Janeiro para Recife em 24/2 para cursar o 3o ano em Olinda/Pernambuco.
- O navio encalha na Ponta dos Castelhanos em 27/2. Tripulantes chegam em Salvador em 3 de março, enquanto Varella fica em Valença,. Depois, parte a pé para Salvador, onde vem a conhecer o poeta Castro Alves, que era primeiroanista .
- Junto de Castro Alves, chega a Recife em 18 de março pelo vapor Oiapock.
- 30/6 morre sua avó e Alice Luande (dia ?).
- Em 18/8 e Castro Alves declamam no teatro Santa Isabel.
- Lança “Cantos e Fantasias” em 10/11.
- Em dezembro, no vapor Víper, parte da Bahia indo para o Rio de Janeiro na companhia de Castro Alves, onde chega no dia 24.
- Neste ano, Varella é considerado o maior poeta do país.
- Visita Rio Claro/ RJ.
1866
- Chega à Santos em 7/3 com o vapor São José, indo para São Paulo para cursar,em março, o 4° ano de Direito.
- Quando pode, viaja pelas cidades vizinhas em busca de novidades e entretenimentos.
- Em junho, perde o ano por faltas.
- Em 27/6 ainda se encontrava em São Paulo.
- Em 26 de agosto, dá início à uma coluna jornalística com as crônicas intituladas “Em falta de melhor”, depois “Folhetins”, no “Correio Paulistano”, sob o pseudônimo de Smarra.
- Parte para Rio Claro/RJ, onde volta a viver, e se desentende com seus conterrâneos, aos quais ataca com poesias ferinas.
- Vive uma período de grande ociosidade sem nada fazer, considerado um período de reintegração à natureza, fase que dura até 1870.
- Não conclui o 4 º ano.
1867
- Em 10/3 casa-se com Maria Belizária, sua prima, a mesma a quem, em sua juventude, dedicara a poesia “Iná”.
- Inicia sua fase nômade de andarilho, e caminha por Angra dos Reis, Mangaratiba, Parati, Bananal, Barra Mansa, Niterói, Santos e São Paulo, de onde parte em junho.
- Em 15/12, publica seus últimos artigos no “Correio Paulistano” sob o pseudônimo de Smarra.
1868
- Fevereiro: publica “Cantos do Ermos e da Cidade”. A atriz Eugênia Câmara desembarca no Rio de Janeiro na companhia de Castro Alves. Em 12/3, Castro Alves chega a São Paulo com Eugênia.
- Eugênia apresenta uma peça de Varella sem mencionar o autor.
- 11/11: Castro Alves se fere dando um tiro no próprio pé numa região do Brás, em São Paulo.
1869
- Publica “Cantos Meridionais”.
- Em 4/1 vai para Paraíba do Sul, onde, no jornal local, publica um artigo em louvor ao pintor e desenhista Vicente José Micolta.
- O pai de Varella vende a fazenda em Rio Claro/RJ.
- Em 7/9 compra a fazenda São Carlos em São João Príncipe, que tem aos fundos o ribeirão das Araras.
1870
- Varella caminha em pelo interior em Barra Mansa e Angra dos Reis, e também em Santos/SP. Em Angra dos Reis passa dois meses, onde publica artigos no “O Artista”. Em Santos escreve o poema “Canção”.
- Nasce sua filha Ruth em 21/5.
- Dá início à confecção de “Anchieta ou o Evangelho nas Selvas”, compondo-o na fazenda do primo Nuno Eulálio em Rio Claro, em Niterói e Paraíba do Sul e outros lugares por onde andou.
1871
- O pai vai morar em Niterói/RJ, onde reside até 1875.
- Varella e esposa moram de favores em casa de parentes.
- Recebe aí o apelido de “Bode”.
- Ajuda esporadicamente o pai em trabalhos jurídicos.
- 27/6: falece o poeta e amigo Paulo Eiró.
- 6/7: falece Castro Alves.
- Caminhadas pela Serra da Bocaina.
1872
- Nasce sua segunda filha, Lélia, em 18/6.
1874
- Nasce seu segundo filho, Emiliano, em Niterói em princípios de novembro, falecendo em 1/12.
1875
- Termina o livro “Anchieta ou o Evangelho nas Selvas”.
- Falece de um ataque de apoplexia, aos 33 anos, em Niterói, RJ, na manhã de 17/2/1875.
- Deixa inédito “Diário de Lázaro” e “Cantos Religiosos”.
1876
- A irmã mais velha, Maria Rita Andrade, falece em 16/4.
- Em 27/5 (ou 5/6?) falece sua mãe, D. Emília.
- O pai muda-se para Mangaratiba, onde reside com o filho Carlos Alberto.
1882
- Carlos Alberto falece.
1891
- O doutor Emiliano falece em 25/3, quando residia no Rio de Janeiro.
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sexta-feira, 27 de março de 2009

ALGUNS RELIGIOSOS E SUAS ESTREITAS RELAÇÕES COM OS PÁSSAROS

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Conhecemos muitas histórias clássicas de religiosos se relacionando com pássaros, bem como, desnecessário dizer, que a conversa entre eles foi exclusivamente unilateral... Quero dizer que nestas "conversas" não se usaram palavras, ficando a relação, quando não no plano mental, limitada ao religioso se expressando por meio de palavras e a ave, se não ficara muda, vocalizou algo lá na sua linguagem animal, inenteligível para nós humanos. Hoje trago aqui algumas destas curiosas histórias que marcaram a história da humanidade.

Noé e a pomba mensageira

Uma dessas mais antigas conversas foi a que se deu entre Noé e a pomba enviada para localizar terra firme após o dilúvio. Palavras não foram ditas, contudo uma mensagem foi entregue pela pomba a Noé. Foi quando ela voltou à arca trazendo um ramo de oliveira no bico, o que significava que o dilúvio havia cessado. De acordo com uma antiga lenda, a pomba voltou para a arca novamente e, desta vez, trazia marcas de barro vermelho nos pés, o que mostrava que realmente “as águas tinham minguado de sobre a terra” (Gênesis 8:11). De acordo com essa lenda, Noé pediu a Deus que os pés das pombas ficassem vermelhos até o final dos tempos. Hoje, todas as pombas e pombos têm os pés vermelhos como forma de sinalizar este acontecimento que salvou o mundo.

John Bastwick

O pesquisador Thomas Keith, em seu livro O homem e o mundo natural: mudanças de atitude em relação às plantas e aos animais (1988), citou o caso de um mártir puritano que fora saudado por pássaros ao desembarcar numa ilha para onde fora degredado. Thomas disse que esse religioso inglês, conhecido como John Bastwick (1593-1654), fora banido para as ilhas Scilly, em 1637, e ao chegar ali

“‘vários milhares de tordos de papo-roxo’ se reuniram para saúda-lo (‘nenhum desses pássaros fora visto naquelas ilhas antes disso’)”.

Cita-se que,a Europa, o tordo de papo-roxo é uma ave silvestre que se tornara mascote honorário sem ser capturada, o que é um caso particular, mas o mesmo Thomas Keith afirmou que o aprisionamento de um tordo da papo-roxo numa gaiola deixou o poeta William Blake furioso.

Provavelmente, esse pássaro, seja o Black-Throated Thrush (Turdus ruficollis atrogularis), uma ave da família dos turdídeos, um representante dos nossos conhecidos sabiás no velho Mundo.

Padre José de Anchieta

Simão de Vasconcelos, em sua Vida do Venerável Padre José de Anchieta, publicada pela primeira vez em 1672, obra baseada em trabalhos anteriores de outros biógrafos jesuítas, cita uma passagem lendária envolvendo o padre Anchieta (1533-1597) que, segundo esse relato, era um beato que tinha o dom de falar com os animais, e, dentre outras notáveis proezas, também dominava os elementos naturais.

A mais célebre passagem de sua vida envolvendo pássaros, foi aquela que, viajando ele em seu incansável trabalho de catequese, invocou um bando de atraentes aves vermelhas para proteger os irmãos do sol causticante. Assim, todos da canoa foram protegidos pela sombra das aves que, a uma ordem sua, puseram-se a voar numa formação fechado sobre a sua cabeça. A ave em questão é o guará (Eudocimus ruber, foto).

Raimundo de Menezes, em Aconteceu na velha São Paulo..., transcrevendo texto do padre Carlos Manoel da Nóbrega, cita outra famosa passagem vivida por Anchieta, aquela em que escrevera poemas na areia de uma praia:

“Foi depoimento comum dos índios - informa-nos Simão de Vasconcelos - que viram por vezes nesta praia uma avezinha graciosamente pintada, que com um brando vôo andava como fazendo festa, enquanto José ia compondo e escrevendo, e lhe, saltava brincando, ora nos ombros, ora nas mãos, ora na cabeça, ou para mostrar a José o cuidado que o céu tinha deles, ou para mostrar aos índios o com que haviam de respeitá-lo.”

Como se pode constatar, impossível, com os dados fornecidos, saber de que espécie é a ave citada.

“Anchieta escrevendo na areia”, óleo de Benedito Calixto.

Outra passagem envolvendo o padre Anchieta, recolheu Carlos Teschauer, que a ouviu de Batista Pereira:

“Contam que longe de Reritiba, sozinho na solidão, como São Francisco Xavier, morreu o Apóstolo do Brasil. Chegaram então duas andorinhas, colocando-se nos ombros do corpo, para vigiá-lo. E quando o levaram em banguê para o cemitério, juntaram-se-lhes mais duas andorinhas, que voaram em frente do préstito fúnebre. Ao enterrarem o corpo, formaram as andorinhas uma cruz acima da sepultura.”

São Francisco de Assis

Certo dia, São Francisco (1181-1226) saiu para pregar num região campestre situada entre Cannara e Bevagna, local onde havia um pequeno descampado rodeado por árvores de variadas espécies. Em dado momento, o santo teve sua atenção despertada para um bando de pássaros, uns pousados nas fronde das árvores, outros voando em revoadas ou espalhados pelo chão no descampado, e todas cantavam com tal alarido que pareciam estar se confraternizando (na ilustração, óleo de J. Segrelles). Para a surpresa de todos, o santo falou a seus discípulos:

“Esperem um momento, vou pregar às nossas irmãzinhas aves!”

Francisco entrou no campo e foi ao encontro das aves pousadas no chão. Mal começou a pregação, as que estavam nas árvores se reuniram às que estavam no chão. Nenhuma se mexia, embora andando ele passasse perto e mesmo chegasse a roçar nelas com a extremidade de sua veste! E dizia às ela:

“Minhas irmãzinhas aves, vocês devem muito a Deus, o Criador, e por isso, em todo lugar que estiverem devem louvá-Lo, porque Ele lhes permitiu que voassem para onde quisessem, livremente, da mesma forma que devem agradecer o alimento que Ele lhes dá, sem que para isso tenham que trabalhar; agradeçam ainda a bela voz que o Senhor lhes proporciona, que lhes permitem realizar lindas entonações! Vejam, minhas queridas irmãzinhas, vocês não semeiam e não ceifam. É Deus quem lhes apascenta, quem lhes dá os rios e as fontes, para saciar a sede; quem lhes dá os montes e os vales, para o seu refúgio e lazer, assim como lhes dá as árvores altas, para fazerem os ninhos. Embora não saibam fiar e nem coser, Deus lhes concede admiráveis vestimentas para todas vocês e seus filhos, porque Ele lhes ama muito e quer o bem estar de vocês. Por isso, minhas irmãzinhas, não sejam ingratas, procurem sempre se esforçarem em louvar a Deus.”

Ao final destas palavras, todas as aves, num gesto quase uniforme, começaram a abrir os bicos e esticar os pescoços, ao mesmo tempo em que cantavam e abriam as asas inclinando a cabeça em direção ao chão, como que a reverenciar o pregador e demonstrar assim que ele lhes havia proporcionado uma grande satisfação.

Ao final, São Francisco benzeu-os com o sinal da cruz e deu-lhes permissão para que se retirassem. Então, as aves levantaram vôo e se espalharam pelo céu fazendo evoluções e cantorias com grande animação. Depois, o bando se dividiu em vários grupos e partiu desaparecendo por trás das matas e colinas.

Uma outra passagem

Conta-se que, dias depois, o Santo foi em companhia de Frei Massau a um lugarejo situado entre Orte e Orvieto, conhecido como Alviano. Ali, pararam na praça do Mercado e como sempre, cantaram uma melodia com versos que convidavam à conversão do coração, com a finalidade de reunir o povo do lugar. Ao final do canto. o santo começou sua pregação. Era ao entardecer, momento em que as andorinhas – as mesmas aves que ainda hoje fazem ninho nos altos muros e nas torres das construções do lugar –, voavam de um lado para outro em evoluções contínuas, cantando alto e de modo quase uníssono. Os habitantes do lugarejo que se comprimiam ao redor do santo para ouvir sua pregação, não estavam conseguindo entender quase nada tal era o barulho que as aves faziam. Então, São Francisco, com a maior tranqüilidade, olhou para elas e com muita doçura lhes disse:

“Irmãs andorinhas, parece-me que agora é minha vez de falar. Já cantaram e falaram bastante! Escutem, pois, a palavra de Deus e fiquem silenciosas enquanto eu falo!”

No mesmo instante, para a surpresa de todos, as andorinhas cessaram sua algazarra e fizeram um grande silêncio, e assim se mantiveram por todo o tempo em que o santo falou.

A morte de São Francisco de Assis

Os últimos anos da vida de Francisco são de uma radiosa beleza. Pressentido São Francisco que estava próximo da morte, pediu aos frades que o levassem para a sua pequena cela na Porciúncula. Era o sábado, dia 3 de outubro de 1226, e o santo vivia os seus últimos momentos. Para resumir a impressão daqueles que o viram na ocasião: Tomás de Celano, um dos seus primeiros biógrafos, diz que o santo foi ao encontro da morte cantando. Ao cair da tarde, estando rodeado pelos frades que choravam e não queriam abandoná-lo, o santo começou a cantar o Salmo 141 de David. Conforme os minutos passavam, o som de sua voz foi perdendo a intensidade, até que, em certo momento, emudeceu por completo. Em seguida, seus lábios fecharam para sempre, e, foi assim que, cantando, São Francisco de Assis adentrou a eternidade. Porém Deus, em sua infinita bondade, ainda permitiu uma última saudação em homenagem ao humilde santo que venerava a Si e aos “irmãos” animais: no mesmo instante, vindo de todos os cantos do horizonte, uma nuvem de cotovias desceu sobre a Porciúncula e ocupou todo o teto da cela de Francisco, espalhando pela redondeza os seus trinados imprevista cantoria – eram as suas amigas que ali chegavam, e em profusão e admirável alarido, vinham dar-lhe o último adeus.

Jesus

As duas histórias envolvendo Jesus e pássaros no período de Sua infância de que se tem notícia, são de natureza diversa e não constam das versões canônicas. Existem inúmeros textos apócrifos que falam desse período, como as que constam da série de livros denominada “Apócrifos - Os Proscritos da Bíblia”, lançado pela Editora Mercuryo, com histórias com textos compiladas e traduzidas por Maria Helena de Oliveira Tricca e Júlia Bárány, e em outro livro, “O outro Jesus segundo os evangelhos apócrifos” (2002), de Antonio Piñero, editora Paulus. Há histórias interessantes nesse gênero, como aquela em que Ele fazia pequenos pássaros de barro, dentre outros animais, e lhes insuflava vida soprando em suas narinas. Há uma outra curiosa passagem – que inclusive consta de um filme que todo ano passa na Páscoa –, em que Ele toma um passarinho morto à pedradas por uma outra criança, e, visivelmente triste e transtornado, sob os olhos surpresos de Maria, o ressuscita fazendo-o voar de suas mãos.

Bem, amigos, isto é tudo o que descolei de histórias do gênero, e se eu descobrir mais alguma, ou se os leitores souberem de outras, me dêem um toque que eu as disponibilizarei neste espaço.

BIBLIOGRAFIA
22 fontes.
Consultar o autor
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segunda-feira, 16 de março de 2009

OUTRAS FRASES DE HUMOR DE MINHA AUTORIA

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ATINAÇÕES

Quem dá aos macacos, empresta à Darwin.

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EM RESPOSTA À UMA MÚSICA DA IVETE SANGALO

Nego, se tu soubesse

O valor que o branco tem

Tu tomava banho de lua

E ficava branco também

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MÁS NOVAS

O Vando lançou um disco, o "Uivando de Paixão". Agora falta o Latino lançar o seu: "Latino pra Lua".

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QUADRINHAS DO CIVILICO

É triste a vida de pobre

Não nasce rei nem rainha

Pobre só vai pro trono

Quando o trono é o do Chacrinha

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O paraíso do rico

É só de brincadeirinha

Rico só vai pro céu

Quando pula amarelinha

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NÃO CONFUNDA

Não confunda o jogo do Coríntians no estádio do Maracanã com o estado dos coríntios no jogo do mar de Canaã.

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MONDO BIZARRE

O problema não reside na Justiça ser cega, mas no advogado não advogar em Braïlle.

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FACULDADES I

Um dia, eu disse ao meu pai que queria estudar agronomia. O primeiro conselho que ele me deu: - Isso mesmo: vai plantar batatas!

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FACULDADES II

Desista de tentar conseguir uma bolsa de estudos aqui no Brasil. Vá para a Austrália - lá, até canguru tem bolsa.

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ATINAÇÕES

Façanha mesmo é avestruz chupando prego para virar tachinha.

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NÃO CONFUNDA

Não confunda o osso buco da perna com o moço de Pernambuco.

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SUTIS DIFERENÇAS

Voyeurismo é calcinha no vão da perna. Fetichismo é calcinha no varal.

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NÃO CONFUNDA

Não confunda a homogenia da coleta seletiva com a hegemonia da seleta coletiva.

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TERRA BRASILIS

Meia idade no Brasil é o período da vida em que se está velho demais para que alguma empresa o admita, e novo demais para que a Previdência Social o aposente.

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terça-feira, 10 de março de 2009

A DOENÇA DO MOVIMENTO ou NÃO ME ENGANA QUE EU NÃO GOSTO

"I Feel The Earth Move"
(Carole King)

“É certo que a percepção é ativa: continuamente 
extraímos padrões dos objetos que enxergamos, 
aguardando por uma comparação adequada.”
(REALIDADE. Os Neurônios. Nº 69, dez. 1971)

“...os olhos são comandados pelo cérebro,
e que esse, quando não entende uma
imagem, ou não está interessado em vê-la,
encontra o famoso ‘jeitinho’ para transformá-la
 em algo aceitável ou compreensível.”
(SAÚDE, set. 1987, Nº 48, pág, 41)


Quem não gosta de ilusões visuais e de desvendar os misteriosos mecanismos cerebrais? Eu sou um deles, curioso que sou desde menino pelas maravilhas da ciência! Vamos, então, a um desses casos que me intrigou desde menino.

Sempre que estou em uma rodoviária dentro de um ônibus esperando ele partir — estando ele ladeado por um ou dois ônibus —, se, por acaso, um destes ônibus começa a dar ré para partir, meu corpo reage como se o meu próprio ônibus estivesse partindo, e como não o é, isto me causa um mal-estar atípico, uma espécie de enjoo, quase vontade de vomitar. É um sintoma muito estranho, já que os olhos veem uma coisa e o corpo sente outra... Vale lembrar que neste, momento, estou concentrado em minha leitura, e se noto algo se movendo nos entornos, é com a visão periférica que percebo a movimentação. Quando a nossa visão periférica ─ que nos permite olhar de soslaio, como se diz: com o "rabo dos olhos" ─ capta o movimento que se desenrola, "por engano" são ativados mecanismos no cérebro que detectam essa movimentação. Uma matéria publicada na revista Mundo Estranho (julho 2009) sobre ilusões de ótica, comentava ao analisar uma ilustração Vale das Espirais Giratórias), cujas figuras pareciam se mover ao se passar os olhos sobre ela: 

"Esta sensação apurada da visão periférica foi muito importante ao longo da evolução de nossa espécie, funcionando como um alerta em relação à presença de presas ou de predadores."

Eis aí mais um dos casos entre a velha disputa entre percepção e ilusão, um caso de desorientação espacial, onde o envio de informações ao cérebro ocorre de modo equivocado.

Até então, tentando descrever o que eu sentia nestas situações, eu pensava que meu cérebro, ao receber estímulos visuais e sonoros, crendo que o ônibus que partia era aquele onde eu estava, reagia como se assim o fosse, e, uma vez equivocado, ficava incapaz de processar normalmente as informações tornando-se “confuso”, o que acabava por provocar o mal-estar. Esse mal-estar seria então provocado por uma falsa situação, num cérebro que fora enganado num estado de comportamento automático inconsciente. Explicando melhor, o movimento do ônibus vizinho era um estímulo visual que iludia meu cérebro, quebrando a ligação existente entre a autoconsciência e o corpo físico; assim, numa espécie de conflito multissensorial, meu sistema nervoso entendia o movimento do ônibus em que eu estava como real, mas, na verdade, não era o que acontecia, daí...


O QUE DIZEM OS CIENTISTAS

Acontece que, lendo recentemente um artigo da neurocientista Suzana Herculano-Houzel (foto), da UFRJ, pude confirmar as minhas ideias que comentei anteriormente. No artigo, Suzana afirma que os enjoos são originados no cérebro e não no estômago, como a maioria das pessoas pensa. Ela explica que o órgão sensorial se comporta como se estivesse recebendo informações espaciais contraditórias. Enquanto os olhos enxergam um movimento, o labirinto, que é responsável pelo equilíbrio do corpo, percebe outro, o que gera uma reação conflitante podendo acarretar enjoos e tonturas. Normalmente, os olhos captam informações visuais que contam ao cérebro, por meio do labirinto, onde o corpo está e em que direção se movimenta. Certas atitudes, como a leitura no carro em movimento, podem confundir o sistema nervoso sobre os dados recebidos dos olhos, ocasionando o enjoo. Hoje, sabe-se que um labirinto mais sensível é susceptível à vertigens.

Lendo também um outro artigo, de autoria do biólogo Fernando Reinach, colhi outros subsídios que complementaram as informações da neurocientista Suzana e me permitiram aprofundar mais ainda neste, diríamos, autoconhecimento biológico. 


Em seu artigo, Reinach (foto) discorria sobre o futebol e o sistema visual humano (SVH). Surgidos há centenas de milhões de anos, esse sistema foi evoluindo e se tornou mais rápido e sofisticado nas tarefas para as quais foi designado. Esse sistema permite que nosso cérebro, observando os movimentos das coisas ante nossos olhos, faça cálculos e seja capaz de ajustar nosso corpo à situação se necessário. Nosso sistema visual considera o corpo que habita como marco zero e ponto de referência. Reinach afirma que com o

“E“desenvolvimento do pensamento abstrato, nosso cérebro passou a dispor de dois mecanismos para compreender o mundo. Um, primitivo, baseado nas informações dos sentidos; outro, capaz de entender o mundo de forma analítica.”

No entanto, o cérebro humano tem dificuldade em aceitar conceitos abstratos que se chocam com observações diretas dos sentidos, e SVH, apesar de eficiente e rápido, é péssimo quando se trata de imaginar movimentos de um ponto de vista que não seja o nosso. Para exemplificar, Reinach cita como exemplo o movimento aparente das estrelas, assim entendido pelo cérebro primitivo, e diz que o analítico é quem foi capaz de descobrir o movimento de nosso planeta, que gira no sentido de oeste para leste, e esse movimento de rotação cria a ilusão de que são as estrelas é que se movem no céu, indo de leste para oeste.

Numa reportagem publicada na revista Isto É (5-5-2010), cujo tema eram os danos causados à saúde pelo uso de imagens 3D, encontramos uma ótima explicação sobre o fenômeno:

“Estes incômodos são reflexos do esforço que o cérebro faz para entender e se ajustar ao que se está vendo e ocorrendo. Eles são mais comuns em pessoas que têm o labirinto — estrutura envolvida no equilíbrio — mais sensível. 

1- O sistema proprioceptivo (composto por receptores presentes em músculos e articulação) informa sobre os movimentos realizados;

2- O sistema vestibular (estruturas do ouvido interno) informa a direção dos movimentos. Por exemplo, se acontece de cima para baixo.

O cérebro entende como conflitantes as informações. Por exemplo: a visão indica que há movimento, mas o labirinto não. Tonturas e enjoos são consequências desse 'desentendimento'. Além disso o cérebro precisa se esforçar mais para conseguir obter a sensação de profundidade proposta pela tecnologia. Isso sobrecarrega o órgão, podendo causar fadiga visual e dores de cabeça." 


UM CASO SUPREENDENTE

O célebre aviador Charles Lindbergh (1902-1974), em seu livro A Águia Solitária (1928), onde narra sua pioneira travessia do oceano Atlântico, ocorrida entre os dias 20 e 21 de maio de 1927, em certo trecho comenta um desses conflitos envolvendo desorientação espacial, que costumam ocorrer em determinadas condições de voo, como, no caso, o chamado "voo cego":


“Estes incômodos são reflexos do esforço que o cérebro faz para entender e se ajustar ao que se está vendo e ocorrendo. Eles são mais comuns em pessoas que têm o labirinto — estrutura envolvida no equilíbrio — mais sensível. "Depois manterei meu curso, permanecerei sobre a camada de estratos da tempestade e abrirei um túnel através dos cúmulos que se erguem diretamente em minha rota. Uma coluna de nuvens priva-me da visão das estrelas à frente, espalhando-se pela parte alta como um enorme cogumelo brotado sobre o céu. Aperto bem o cinturão, faço descer um pouco o nariz e ajusto o estabilizador para voo nivelado. Nos minutos que medeiam enquanto me aproximo, faço o preparativo mental e físico para o voo cego. 

O corpo há de ficar severamente inteirado de que o espírito vai tomar o comando. Os sentidos devem ser convocados e postos em linha na mais estrita disciplina, enquanto a lógica ocupa o lugar do instinto como comandante. Se o corpo tem a sensação de que cai uma das asas e a mente afirma que não é assim (porque a bola e a agulha do indicador de giros continuam centradas no lugar devido), devem os músculos obedecer à decisão do espírito, por mais disparatada que pareça. Se os olhos imaginarem ver o fulgor de uma estrela embaixo, onde pensam que deveria estar o horizonte, se os ouvidos advertirem que o ritmo do motor é demasiado lento para o voo nivelado, se os nervos afirmarem que a pressão do encosto do assento está aumentando (como acontece numa subida), mesmo assim as mãos e os pés devem ainda obedecer às ordens da mente. 
Ela também efetua um esforço tremendo quando, desprezando os instintos corporais a que esteve muito tempo obedecendo, se vê obrigada a seguir a mecânica imparcialidade de umas agulhas que percorrem seus quadrantes. Por séculos incontáveis acostumou-se a fiar nos sentidos, capazes de manter o corpo erguido em meio da noite mais escura e adestrados a recuperar instantaneamente o equilíbrio a qualquer tropeço. Ainda privados da vista, são susceptíveis de manter a estabilidade do cego. Por que, então, haveriam de ser tão impotentes num aeroplano?"

CONCLUSÕES

Então, baseando-me nestas considerações, estando eu sentado num ônibus que meus olhos dizem estar em movimento, os dados sensoriais capturados por eles são enviados ao SVH, que tentam coordená-los. Apesar de meu sistema analítico compreender o engano – que não é o ônibus vizinho que se move –, o sistema primitivo insiste em me informar que o ônibus onde estou é o que se movimenta. Daí, as estruturas citadas, procurando fazer os ajustamentos posturais, ante a confusão de dados confrontados, provocam a sensação de vertigem. Enfim, poderia dizer que esse conflito se assemelha a uma espécie de timing, onde o “tempo” da visão” é diferente do “tempo” do labirinto. O que mais estranha neste fato é que, diria, estou sempre caindo nesta "cilada", sendo novamente enganado por ela sempre que uma nova situação semelhante aconteça. Uma reportagem publicada na revista Saúde (set. 1987) cita que “Conhecer o truque de uma ilusão não imuniza contra ela.”  Diz ainda que “os olhos são comandados pelo cérebro, e que esse, quando não entende uma imagem, ou não está interessado em vê-la, encontra o famoso ‘jeitinho’ para transformá-la em algo aceitável ou compreensível.”

Em suma, nosso sistema visual, que por milhões de anos foi selecionado para acompanhar o movimento dos objetos, está acostumado, diríamos, à uma rotina realista e essas situações aparentes induzem-no à erros de processamento de informação visual, forçando-o à um alerta inconsciente que provoca sensações desagradáveis quando ele fica “confuso”.


OUTROS "MALES" ALGO SEMELHANTES

Existe um fenômeno fisiológico que causa um mal-estar algo semelhante, chamado doença do movimento, ou cinetose, que é aquele enjoo que acontece ao se viajar em barcos em alto-mar, devido aos mesmos conflitos sensórios de interpretação do cérebro, mas já viajei em alto-mar e, felizmente, jamais sofri o mais leve enjoo. 


O astrônomo Carl Sagan (foto), em clássico seu livro Dragões do Éden (1978), Prêmio Pulitzer – para muitos a mais bela obra do autor –, cita numa passagem, uma dessas curiosas “peças” que o cérebro nos prega:



“Crises convulsivas (...) têm sido relatadas quando um paciente epiléptico está dirigindo um automóvel ao pôr ou ao nascer do sol ao longo de uma cerca de estacas pontiagudas entre ele e o sol: a uma determinada velocidade, as estacas interceptam o sol na exata velocidade crítica capaz de produzir uma oscilação na frequência ressonante para iniciar tais crises.”

Sagan, provavemente se referia ao fenômeno epilético descrito pela primeira vez pelo Dr. Marcel Lapipe, então médico do Hospital Sainte-Anne, de Paris, fenômeno este considerado “insólito, mas verossímel”, usado para explicar uma série de mortes estranhas em acidentes de trânsito na Rodovia 7, entre Briare e Montargis (ambas, comunas francesas), acidentes recorrentes que mataram inúmeros membros da família Michelin entre 1937 e 1949:

“Um indivíduo que recebe nos olhos 10 flashes por segundo entra em crise, se é predisposto à epilepsia. Quando o sol se põe atrás da fileira de árvores da Rodovia National 7, um automobilista que vá a 120 quilômetros por hora, recebe, pelo jogo de sombra e claridades, entre os troncos e as ramadas, 10 flashes luminosos por segundo.”


EPÍLOGO

Não, amigos, definitivamente eu não sofro de crises convulsivas, tampouco da doença do movimento diante de ilusões visuais. E, neste último caso, o meu problema não é com veículos aquáticos e a água, melhor dizendo, com o vaivém das águas, mas tão-somente com ônibus e carros – e eu sentado num banco ou poltrona, lendo ou olhando para fora da janela –; aliás, sempre tive o costume de ler dentro de ônibus e carros e sempre sentia mal-estar, mas isto são páginas viradas na minha vida – de tanto insistir, meu corpo se adaptou. No entanto, a ilusão do falso movimento e o sintoma do enjoo ainda persistem; na verdade, penso que eles surgiram depois que o meu cérebro concordou com minha insistência em ler dentro de veículos em movimento. 

Leitor voraz que sou – e, no caso, aquele que perde o ponto onde devia descer –, meu corpo tinha mais é que se adaptar mesmo, para fazer jus à essa necessidade inata de ler em qualquer lugar de que “padeço”, seja em pé numa fila, seja andando pelas ruas, no banheiro etc. Às vezes penso que meu dia deveria ter 48 horas, só para poder passar metade deste tempo lendo, mas... 


Enfim, não sei de alguém que após saber que as estrelas não se movem, sentiu tonturas com a rotação da Terra, sujeito do tipo maluco beleza – “Pare o mundo que eu quero descer!”, mas, brincadeiras à parte, imagino que o acontece com meu cérebro, nestas situações dentro de ônibus, deve ser um protesto seu, que ainda guarda memórias do tempo em que eu não podia ler com veículos em movimento – hábito que, decididamente, não lhe fazia bem –, e hoje, nos momentos de ilusão de falso movimento veicular, ele deve bradar lá no seu íntimo: – “Não me engana que eu não gosto!”



BIBLIOGRAFIA:  11 fontes; 
contatar o autor.
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sábado, 28 de fevereiro de 2009

OS SÁBIOS, E SUAS SÁBIAS RESPOSTAS...

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Sempre gostei de colecionar fatos curiosos sobre as pessoas que admiro, imaginando que um dia eles tivessem alguma serventia. O advento dos blogs veio viabilizar essa minha idéia. Assim, trago hoje duas histórias interessantes e semelhantes que aconteceu com dois dos maiores gênios da humanidade.

Esta curiosa passagem, se deu com o compositor Beethoven (1770-1827). Nela, podemos notar que o gênio, sabiamente, se poupou de explicar inutilmente sua arte à uma pessoa leiga e inconveniente, por sinal, uma condessa...

Conta-se que, certa vez, quando ele executava uma de suas sonatas, uma condessa que o ouvia lhe perguntou:

- "Muito bem, mas o que quer dizer com isso?"
Ele tornou a sentar-se ao piano e repetiu a peça. Ao terminar, explicou:
- "Isto mesmo"


Com o pintor e escultor Michelangelo (1475-1563) se deu fato semelhante, e ele também se esquivou com maestria da pessoa importuna, desta vez um papa...

Quando o grande mestre renacentista começou a pintar a capela de Sistina, como trabalho fosse demorado e houve imprevistos no percurso, o papa Julio II começou a pressionar o artista para ver a pintura. Esse diálogo entre os dois que ficou célebre:

- "Quando vai terminar" perguntou o papa.
- "Quando tiver terminado" - respondeu ele.

Ambas as histórias nos ensinam que, muitas vezes, ao lidar com gênios, todo cuidado e semancol é pouco, ou, como o Paulo Henrique Amorim já disse sobre o Romário: "tolere o gênio"... Na verdade, gênio mesmo do futebol é só o Pelé. Aliás, nem o Maradona é gênio, que, enquanto o Pelé se promovia com Vitasai, o argentino ia de cocaina...
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quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

HÁ QUASE 70 ANOS, O PARDAL CHEGAVA À ARARAS

Analisando as pessoas desse velhos tempos, há pouco mais de 60 anos atrás, é difícil acreditar que alguém pudesse ter sua atenção despertada por um simples e exótico animalzinho alado chegado pela primeira vez a cidade, a ponto de, anos depois, registrar o fato num jornal. Mas foi o que aconteceu, e, no mínimo, a pessoa devia ter uma relativa queda por pássaros.

Foi nesta época que, dando continuidade à sua ferrenha e vitoriosa bioinvasão, um novo pássaro originário do Oriente Médio começava a se espalhar pelas cidades do interior paulista. Como vinha ocorrendo desde 1903 à partir do Rio de Janeiro, onde fora introduzido, esse pássaro estrangeiro aportava em nossa cidade, e o fato não passara em branco para um atento articulista de um jornal local, que por uma feliz iniciativa, registrara o acontecimento numa breve crônica, apesar de o fazer mais de uma década após o acontecido. Explica-se: na época, o observador era um aluno de grupo escolar.

Antes de mais, nada, gostaria de informar que o que escrevi aqui, só foi possível devido ao fato de ter ganho um valioso presente, que me fora ofertado por um velho amigo das letras, o professor e escritor Alcyr Matthiesen, uma coleção completa de um extinto jornal ararense que, de cabo a rabo, eu já pesquisara anos atrás. O que não me conformo é que a citada crônica de onde retirei as informações para redigir este post, eu não descobrira durante estas pesquisas e passei batido por ela, logo eu que sou que sou tão meticuloso e atento...

Mas, afinal, de que pássaro estou falando?

No distante 1941, o popular e cosmopolita pássaro conhecido como pardal (Passer domesticus), chegava à cidade para ficar, e o já citado articulista, cujo nome era João das Neves, em sua coluna no Jornal de Araras denominada Bilhete de Araras, rememorava o “feito”, registrando a histórica data numa singela e simples crônica. No entanto, eram passados 13 anos do fato, mas mesmo assim, João das Neves, em 11 de março de 1954, registrava para a posteridade o curioso acontecimento.

Não se sabe se o pardal viera sozinho, ou em bandos, como era de se esperar – se é que alguém esperasse... O que João das Neves vira fora apenas um discreto casal que timidamente aportava na cidade... Mas qual fora o lugar que ambos buscaram para estabelecer domicílio na pacata cidadela de então? Seria um arbusto, uma árvore ou um buraco num barranco, como era de se esperar de um pássaro? Nenhuma das alternativas – não fugindo às suas natas tendências sinantrópicas, o casal forasteiro escolhera uma boca de jacaré – uma dessas tubulações que escoam a água das chuvas, nos altos do telhado daquela que é a primeira, e única de então, escola pública de Araras, o “Grupo Justiniano”. Será que ali, num estabelecimento de ensino, os pardais obteriam melhores informações sobre a pequena cidade que escolheram para se fixar?


Na foto, uma reconstituição que fiz do casal na “boca de jacaré”, remetendo ao ano de 1941.


João das Neves, na época, era aluno desta escola, e as informações que recebera sobre o novo passarinho foram passadas a ele e para todos os alunos pelo célebre professor Vicente Padovani, docente que, por sinal, fora professor de meu pai e, décadas depois, já idoso e em fim de carreira, deste que vos escreve. Padovani, informado que era, já tinha ciência da diáspora promovida pelo novo pássaro introduzido no país décadas atrás, e, exceção à regra, estava a espera, mais dia menos dia, de sua chegada à cidade. Chegado, enfim, o dia aprazado, e instado sobre tal, fez questão de repassar a novidade a todos a escola. O que não se sabe é se ele ciceroneu o casal mostrando-lhes as vantagens de se fixar na modesta e promissora cidade em que se instalavam, mas convém reconhecer que ambos foram se instalar justamente na escola em que trabalhava um professor que bem conhecia a sua espécie, e seus hábitos...

Mas, enfim, aqui, o precioso texto histórico de João de Deus:

“Nossa atenção vinha sendo despertada alguns dias, por um casal de passarinhos que vinha habitando uma das bocas de jacaré por onde saem as águas das chuvas, lá do Grupo Escolar naquela época, mas hoje como outros surgiram, foi necessário a designação pelo nome, Grupo Escolar Cel. Justiniano W. de Oliveira.

Desde vários dias vinha­mos olhando para aqueles passarinhos, dos quais nenhum de nós havíamos vis­to e por isso ninguém sabia o nome. Eram desconhecidos para nós. Era aquela a primeira vez que víamos passarinhos como aqueles. E eles continuavam, dias após dias, a chilrear, com o corpo parece que estufado. Em um grupo escolar ou em qual­quer reunião de garotos, e comum aparecerem os 'entendidos', os quais davam nomes aos passarinhos. Nunca certos porém.

Certa manhã, logo ao entrarmos em classe, o prof. Vicente Padovan nos explicou alguma coisa sobre eles. Pouco eu me lembro. Só sei que eram passarinhos que alguém trouxera de Portugal, e que aqui encontrara ambiente para criação. Em São Paulo, Campinas, eles já eram conhecidos, e vinham agora se alastrando mais para o interior. Aqueles eram os primeiros a aparecerem em nossa cidade.

Estávamos no ano de 1941, e eram aqueles os primeiros pardais que por aqui arribavam.”

Sete anos depois, o pardal já era muito comum na cidade, e inclusive servia como personagem de crônicas nos jornais locais. Em 20 de junho de 1948, um tal de Zezinho publicava uma crônica no jornal Tribuna do Povo, denominada “Os pardais e os pobrezinhos”, onde, pela voz dos pardais, citou que na época, havia setenta engrates meninos trabalhando na praça Barão, e que o prefeito queria acabar com os bancos “do jardim, para acabar com os namoros”.

Em seu livro Contribuição à História Natural e Geral de Pirassununga (1974), o falecido professor Manoel Pereira de Godoy, ex-funcionário do CEPTA, de Pirassununga, registrou a chegada do pardal à esta cidade no ano de 1943, e sete anos depois em Cachoeira das Emas, portanto, o pardal atingiu Pirassununga dois anos após Araras e, ao que se pode depreender, Leme um ano depois.

Para quem quiser melhores e mais detalhadas informações sobre o pardal, como sua controversa introdução no país, bem como sua bem sucedida difusão, poderá obtê-las neste mesmo blog, cujo link é:

http://apologo11.blogspot.com/2008/07/pardal-100-anos-de-brasil.html

FONTES (4):
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