sexta-feira, 3 de julho de 2015

RESENHA DE LIVROS E REVISTAS LIDOS POR MIM EM JUNHO DE 2015

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1- Os 80 anos do Pato Donald - Por seus principais artistas. Edit. Abril, 2015. Aos 9 de fevereiro de 1935, o pato mais querido do Planeta vinha à luz! Aqui, uma coletânea de algumas de suas melhores história por diversos desenhistas em todas as épocas, algumas inéditas no Brasil. Sempre disse que sou mais Pato Donald que Mickey Mouse, pois este personagem é maluco e engraçado como poucos, batendo de longe "Os Sobrinhos do Capitão", "Beavies e Butt Head" e afins de longe; aliás, as histórias deste livro são as mais malucas possíveis, insanas até! São 480 páginas do mais puro humor e maluquices! Rachei o bico!!!...

2- PZ - Poeira Zine Nº 60, maio/junho 2015. É uma revista de rock sessentista e setentista, que vale por um grosso livro, tantas são as matérias escritas com letra miúda. Para quem curte ler sobre essa fase áurea da Contracultura, quando movimento estava no auge, ela é um prato cheio! São tantas coisas boas para se comentar que nem cabe aqui, mas o destaque fica para as matérias com o Jeff Beck Group, Os Mutantes e a banda Mott The Hopple.


 
3- Aventuras na História. Como pensavam os kamikazes. Julho 2013. A revista traz uma reportagem especial revelando a verdade sobre os vários mitos que cercavam os pilotos japoneses suicidas da Segunda Guerra Mundial conhecidos como kamikazes. A maioria esmagadora deles era composta de estudantes, recrutados de universidades antes do início da ação, principalmente a partir de dezembro de 1943, quando, em apenas três dias, 6 mil deixaram as salas de aula. Hoje, sabe-se que ninguém era voluntário e foram forçados a cumprir suas missões. O treinamento era brutal, e a tropa era surrada por qualquer motivo, seja para "formar o caráter", seja  simplesmente por causa da inveja dos sargentos que os consideravam universitários filhinhos de papai. A ironia está no fato que mais de 3 mil destes pilotos perderam a vida em ataques geralmente inúteis, e apenas um em cada 10 deles atingiu seu objetivo. Cogita-se atualmente que, em face do pavor dos EUA de que o ataque japonês recrudescesse, eles tenham optado por bombas de destruição em massa, como finalmente se deu com Hiroshima e Nagasaki. 


4- O Livro Oficial do Cometa Halley. Brian Harpur. 1985. Mais um dos bons livros surgidos no retorno do cometa Halley em 1986. Como a maioria dos livros lançados na "febre", além de traçar um panorama do cometa desde sua primeira aparição, orienta como observá-lo em seu retorno. Difere dos outros por trazer curiosidades e bizarrices pouco conhecidas de suas aparições, poesias e os cometas na literatura mundial. Um bom livro e deleitura agradável.

 
5- Cometas - Os vagabundos do Espaço. David A. Seargent. 1982. Outro livro vindo na febre cometária que antecedeu o retorno do Halley em 1986. Livro instrutivo, que descreve a anatomia dos cometas, os cometas mais famosos, o próprio Halley e outras curiosidades. Livro mediano, mas interessante.
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quinta-feira, 2 de julho de 2015

OS 40 ANOS DO DISCO “FRUTO PROIBIDO”, A OBRA-PRIMA DE RITA LEE & TUTTI FRUTTI

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“É dessa 'estrela' que agora tratamos”
(Cometas - Os Vagabundos do 
Espaço. David A. Seargent, 1982)

ar

Um livro do Monteiro Lobato, o saboroso “Viagem ao Céu”, obra que eu li avidamente quando criança, pois trata de temas sobre Astronomia, traz o seguinte texto:

“Era em Abril, o mês de dia de anos de Pedrinho e por todos considerado o melhor mês do ano. Por que? Por que não é frio nem quente e não é o mês das águas nem de seca – tudo na conta certa! E por causa disso inventaram lá no Sítio do Pica-Pau Amarelo uma grande novidade: as férias-de-lagarto (...) Já que o mês de Abril é o mais agradável de todos, escolheram-no para o grande “repouso anual” – o mês inteiro sem fazer nada, parado, cochilando como lagartos ao sol! Sem fazer nada é um modo de dizer, pois que eles ficavam fazendo uma coisa agradabilíssima: vivendo! Só isso. Gozando o prazer de viver..."


Mas porque, amigos, querendo eu lhes falar da efeméride do disco “Fruto Proibido”, abro a matéria com uma transcrição de um texto de Monteiro Lobato? Pois bem: é justamente em Abril de 1975, no melhor mês de estação do Outono, que estava em processo de elaboração a obra-prima que é este disco. Pois, se vocês assistirem ao clipe oficial da balada “Ovelha Negra”, poderão imaginar que, naquelas imagens, Rita está “lagarteando” como a levada da breca boneca Emília. Vemos ali que ela

“Levava uma vida sossegada
Gostava de sombra e água fresca”...

Onde ouvia:

“O som das nuvens
A conversa do vento
(...) O som das flores
O murmúrio do céu”

Para mim também, como a turma do Sitio, acho este mês outonal o melhor do ano, e é nele que sempre procuro tirar as minhas férias.

Mas, antes ainda de partir para o assunto principal, gostaria de dizer que lembro-me perfeitamente do que aconteceu num final de tarde da estação seguinte, num pôr do Sol invernal, em que comprei esse disco, pois ao chegar das escola (eu tinha 14 anos) com meus livros e cadernos e o “Fruto Proibido” debaixo do braço —, à Usina Palmeiras (Araras-SP), onde morava, desci do ônibus e presenciei algo inusitado. Nesta tarde, ocorreu um incrível fenômeno atmosférico em que todo o céu acima da Usina ficou sob um tapete de nuvens baixas que se avermelharam intensamente ao crepúsculo.  Ventos vindos do lado sudoeste da cidade, da região de Rio Claro, trouxeram estas nuvens para estes lados onde o fenômeno se deu. Fora um final de tarde inesquecível!


A Usina Palmeiras, em crepúsculo invernal, no distante 1983.

Coincidentemente, Araras é cidade vizinha de Rio Claro, onde nasceu a mãe Rita, cidade em que ela passava as férias na infância.


Rita Lee, de camisa xadrez, em foto feita durante sua infância em Rio Claro-SP.


Voltando ao "Fruto Proibido", décadas depois, o jornalista Bernardo Carvalho, em 22-12-1996, disse numa reportagem na Folha de São Paulo que

“A imagem e a voz de Rita Lee estão associadas a um passado ainda muito recente para poder desfrutar das glórias da nostalgia.”

Quando escrevo este presente texto, estamos em 2015, portanto há 40 anos do citado lançamento, e eu pergunto: Será que já chegamos neste período nostálgico?  Não pretendo responder esta pergunta, mas digo com toda sinceridade, que é só ouvir essa maravilha que é “Fruto Proibido”, que todas as visões e sensações incríveis vivenciadas naquela incrível tarde crepuscular afloram à minha mente nostálgica.



Sobre as datas de lançamento


O disco, ao que se depreende, foi lançado no finalzinho de junho, tendo uma pequena resenha no jornal Folha de São Paulo em 30-6-1975. E ela trazia um desabafo, talvez dito pela própria Rita:

“Não aceitamos essas imposições (as faixas marcadas para divulgação pela Som Livre). São boas, mas não são as melhores do álbum. ‘Pirataria’ é uma boa faixa. Existem outras duas de alta qualidade, como ‘Fruto proibido/Esse tal de roque enrow’”.

A revista Veja, por sua vez, trazia sua resenha duas semanas depois, na edição de 16 de julho. De curioso nela, podia se ler o texto de Tárik de Souza, que se já mencionava Rita como superestrela do rock nacional:

“Rita Lee parece outra vez disposta a passar de superestrela do acanhado rock nacional a primeira dama da música jovem em geral”.

Já a crítica do jornal carioca Jornal do Brasil era bastante breve, dizendo que havia


“um pouco de rock-nativo no LP Fruto Proibido”.


Por sua vez, a revista Geração Pop, de julho, trazia uma pequena resenha do disco que nada acrescentava nem orientava o ouvinte.

Rita Lee, uma quase freira...
Assim, algum dia do distante mês de junho de 1975 — portanto comemorando jubileu de rubi —, chegava às prateleiras das lojas brasileiras de discos aquele que pode ser considerado uma das principais obras-primas do rock and roll brasileiro, o disco “Fruto Proibido", da então já veretarana Rita Lee e seu ótimo grupo, o Tuttti Frutti. Após o relativo o sucesso de "Mamãe Natureza", o hit de do disco “Atrás do Porto Tem Uma Cidade”, “Fruto Proibido” era a consagração de Rita como rockeira, e devemos dar graças aos céus por isso, uma vez que os conventos perderam uma (im)possível freira levada da breca, enquanto o rock brasileiro ganhou aquela que é sua maior representante em todos os tempos, a "Santa Rita de Sampa"!...



Como era o cenário musical na época

Numa breve revirada à procura de lançamentos nas bancadas das lojas de discos, podíamos nos deparar com "Slade in Flame" do Slade; "Live" do Uriah Heep"; o primeiro LP solo do Ney Matogrosso, no vitorioso LP homônimo; idem o João Ricardo, ex-Secos & Molhados, no LP que não aconteceu; também o célebre primeiro LP solo do ex-marido da Rita Lee, o "Loki" do Arnaldo Baptista; o primeiro do Emerson, Lake & Palmer, de cujo hit “Lucky Man” Rita e o Tutti Frutti fariam um cover no show “Fruto Proibido”; o novo LP de Elton John, o autobiográfico “Captain Fantastic & the Brown Dirty Cowboy”, e a gravadora aproveitou e lançou também no Brasil o seu primeiro disco, o fraco "Empty Sky". Lançado também nesta leva, e com atraso de três anos, encontrava-se o duplo ao vivo do Deep Purple, o ótimo “Made in Japan”; com atraso também vinha “Visions of The Emerald Beyond” da Mahavisnhu Orchestra, e “Straight Shooter”, com o Bad Company (do LP anterior, o primeiro, a banda faria um cover de "Ready for Love" também no mesmo show). Podiam ainda ser encontrados o também duplo “Tommy”, do The Who; os guitarrísticos “For Earth Below do Robin Trower e “Blow by Blow” do Jeff Beck; os eletrônicos “Autoban” do Kraftwerk, e “Rubycon” do Tangerine Dream. Finalmente, “Molhado de Suor" do Alceu Valença, e o Raul Seixas, numa espécie de prévia ao “Gita”, com a coleção de sucessoS “Vinte Anos de Rock and Roll”.



Curiosamente, em 18 de junho de 1975, às vésperas do lançamento de “Fruto Proibido”, resenhando o novo disco "King Arthur" do tecladista Rick Wakeman na revista Veja, o crítico musical Tárik de Souza parecia estar vaticinando o movimento punk: "Ora, deixem o rock envelhecer (e voltar a infância) em paz"...

Nessa avalanche de bons lançamentos, vinha Rita e o seu Tutti Frutti, com os hits “Ovelha Negra”, “Agora Só Falta Você” e “Esse Tal de Roque Enrow”, que dividiam em pé de igualdade as rádios com músicas românticas como “Lovin’ You” de Minnie Riperton, “One Day in Your Life” com o Michael Jackson e “I’m Down” dos The Hollies; e, na ala rock, com “Pinball Wizard” com o Elton John e “I Know What I Like” do Genesis. Dentre as baladas nacionais, se destacavam “Na Sombra de uma Árvore” com o Hildon, e a chorosa “Quantas Lágrimas” com a Cristina Buarque.


Foi dentro deste contexto que “Fruto Proibido” chegou às lojas, em suma, nada que lhe fizesse uma grande afronta à ponto de desviar a atenção do rockeiro brasileiro para a beleza interna e externa que era o promissor LP.     




Revista Violão & Guitarra Nº 15, 1975.

O estilo das músicas

Na mesma linha do disco anterior, “Atrás do Porto Tem Uma Cidade”, “Fruto Proibido” era uma perfeita mistura de blues e hard rock, tudo embalado em incríveis arranjos com sabor pop, a cargo da competente banda.

A temática das letras iam desde rebeldia e drogas (subliminarmente), amor, feminismo, ironia e ecologia, em suma, um repertório de temática híbrida que agradou em cheio os jovens da época. Por isto tudo, “Fruto Proibido” acabou sendo considerado o álbum mais roqueiro e (ins)pirado da carreira da cantora.

Aliás, vale ressaltar que a irreverência seria uma de suas tônicas a partir desse disco — vide (no ano seguinte) “Arrombou a Festa”, onde, indo da ironia à impiedade, Rita debocha com meio mundo dos artistas da MPB da época, lembrando que houve uma continuidade em “Arrombou a Festa II” anos depois (1979), onde ela fez o serviço completo, não deixando pedra sobre pedra...


Shows em Poços de Caldas, 22 e 23 de novembro de 1975.


Os méritos do disco e o sucesso

Atualmente, o disco é cotado pela crítica especializada como o melhor álbum de rock nacional de todos os tempos. Numa lista com os 100 discos mais importantes do país, a revista Rolling Stone brasileira incluiu o disco, e o considerou como o 16 melhor álbum de todos os tempos da música brasileira. Lembremos que “Fruto Proibido” é o quarto disco solo de Rita Lee, e o segundo com o Tutti Frutti. Foi também incluído em uma lista da revista Super Interessante como um dos principais álbuns do rock brasileiro.


E o sucesso foi tanto que tanto que “Ovelha negra” e “Agora só falta você” subiram aos primeiros lugares das paradas, com direito à clipes em um programa de alto ibope, fatos surpreendentes em se tratando do tipo de rock que se fazia naquela perigosa e arriscada época ditatorial, uma vez que, como a própria Rita cantou depois: “rockeiro brasileiro sempre teve cara de bandido”. Convém lembrar que o disco era da gravadora Som Livre, ligada à Rede Globo, e a execução das mesmas país afora neste programa — o Fantástico — , ajudou ela e banda a conquistar um disco duplo de platina, já que haviam atingido na época a marca de 200 mil cópias vendidas. No montante, até hoje, computa-se que foram vendidas 700 mil cópias, façanha só comparável aos grandes vendedores da época, leia-se: Roberto Carlos, Secos & Molhados e Raul Seixas.




Além disso, numa enquete feita pela revista Geração Pop, em dezembro de 1974, Rita Lee foi eleita a “Melhor Cantora de 1974”, e de quebra, o maior nome feminino do nosso rock, resumindo: a “Rainha do Rock Brasileiro”! Suas constantes aparições nesta revista levaram à conclusão de que foi a personalidade feminina do rock que mais teve matérias em suas páginas até setembro de 1976. Inclusive, neste último ano, em janeiro, Rita foi eleita também pela revista Rock, a História e a Glória como a melhor cantora de 1975.





Os shows inovadores

Desde o show anterior, o do disco “Atrás do Porto Tem Uma Cidade” — considerado o melhor show do ano de 1974 pela citada revista POP —, Rita vinha chamando a atenção pela beleza, qualidade e profissionalismo de suas apresentações. 

A revista Geração Pop de novembro de 1974, trazia, além de belíssimas fotos, o seguinte texto:

“Rita Lee está com tudo mesmo! Seu novo show, Atrás do Porto Tem uma Cidade, foi tão bem montado que deixou os empresários Alberto Kossky e George Ellis impressionados. Tanto que, logo depois da estreia em São Paulo, no teatro Bandeirantes, eles começaram a transar a apresentação do show no Carneggie Hall de Nova York””


Mas o tal show não aconteceu e não se sabe o porquê.  

O carro chefe do disco era a lírica e belíssima balada “Menino Bonito”, que já dava indícios da inspirada compositora que estava “surgindo”. Neste show, além de uma equipe de cerca 20 pessoas, ela tinha nada mais nada menos que 18 toneladas de equipamento e um palco de 12 por 15 metros, o que não era pouco naqueles tempos difíceis em que tudo era absurdamente caro em se tratando de “aparelhagens de som”. 



Sobre sua equipe, Rita revelou na época:

“Somos, ao todo, vinte cinco pessoas. Sete se apresentam tocando, cantando e dançando comigo. Os outros são técnicos: de som, iluminação, cenografia, etc. Por isso só podemos nos apresentar em grandes palcos e nosso show sempre parece uma festa incrível.”

Sobre o show “Fruto Proibido”, Antonio Carlos Duncan, então diretor da gravadora Odeon, citou na época: “o único show que tem condições de ser levado para qualquer lugar“. Duncan afirmava isto baseado na “postura do grupo e da artista”, bem como na “estrutura e retaguarda”. O crítico Carlos A. Gouvêa, da Folha de São Paulo, em 18-8-1975, citou:

“Há muito tempo que não víamos em palcos de São Paulo um concerto de rock com um desenrolar mágico, espontâneo, de qualidade e com características profissionais (...)”.


Roberto Nascimento, do blog “Estadão”, escreveu:

“Em termos visuais, o disco levou a sério a proposta profissionalizante. Andy Mills apostou em um espetáculo colorido com Rita Lee de luvas de cetim, corpete e cinta-liga e o alto e bom som mixado por um sistema ‘surround’, uma grande novidade para a época.”



Trabalho cênico de Primeiro Mundo

Outro ponto alto dos shows era o visual criado pela iluminadora Judy Spencer (foto) sócia de Mônica Lisboa, que tornou seu trabalho de iluminação uma inovação no Brasil, isto, após ter assessorado os próprios Mutantes após a saída de Rita da banda.

O trabalho de Judy era inédito no país, porém, tudo era feito na base do teste e do improviso, mas usando a criatividade e a invenção O problema é que, no Brasil, não havia boas aparelhagens de iluminação de fabricação nacional, nenhum curso técnico no ramo nem professores, sequer uma revista especializada sobre iluminação.

Com a vinda de Alice Cooper em março/abril de 1974, Judy Spencer e Mônica Lisboa, que eram sócias, compraram 22 refletores de mil watts cada antes de a banda retornar aos EUA, sendo detentoras, então, do maior aparelhagem de iluminação do país. Duas das luzes dos 22 refletores comprados podem ser vistas na capa de “Tudo Foi Feito Pelo Sol” dos Mutantes, que são aquela bonita combinação de luz laranja e violeta, a mesma que está também na capa e contra-capa o disco ”Killer” do Alice Cooper, e semelhantes à da capa do então recém-lançado “Made in Japan” do Deep Purple.



O rigor e o bom-gosto eram a tônica de Judy, a ponto de ela ser considerada o 7º membro do Tutti Frutti, no que remetia ao ótimo Mick Brockett, o criativo iluminador inglês da banda de rock progressivo Nektar, que devido ao seu impressionante trabalho visual com a banda nas luzes, projeções visuais e montagens de palco, era considerado o 6º membro.

Em suma, Judy é considerada hoje a pioneira da iluminação cênica no país — sorte da Rita Lee!


Famoso tecladista progressivo se deslumbra com Rita

Mas os elogios não pararam por aí: no dia 12 de agosto de 1975, desembarcava no Brasil o tecladista da banda progressiva Yes, que vinha visitar o país e agendar gravações, no que aproveitou o ensejo para conhecer o rock que era feito por aqui, o que não lhe agradou muito pois, com raras exceções, pois disse só ter visto gente querendo imitar o que se fazia nos EUA e na Inglaterra. Rita foi uma exceção — após assistir seu novo show, exclamou:

“Muito profissional, muito sexy e sobretudo uma grande atriz.”

Era na noite de estreia do show em São Paulo, quando cerca de duas mil pessoas lotavam o teatro “Aquarius”. 


Um príncipe, fã da Rainha do Rock Brasileiro!

Décadas depois, um outro inglês não menos célebre, viria engrossar o coro de fãs de Rita: nada mais nada menos que o Príncipe Charles, que revelou ser Rita Lee a sua cantora predileta, no que menosprezou não só Elton John (o predileto de sua esposa, a finada princesa Diana), como também a banda Queen e os próprios Beatles!



Cita-se que os shows de estreia no Rio de Janeiro, no teatro “João Caetano”, entre 15 e 19 de julho, 10 mil pessoas foram computadas, lembrando que um show extra teve que ser acrescentado devido ao enorme sucesso. Rita relembrou estes memoráveis shows:


“Desta vez, estreamos no Rio o show Fruto Proibido, que apresenta as músicas de nosso novo long- play. Ficamos no Teatro João Caetano apenas quatro dias. A casa sempre lotada, tivemos de fazer uma sessão extra: uma vesperal no domingo. Houve até venda em câmbio-negro: a garotada curtiu mais do que o público da sessão noturna.”

O primeiro anúncio do primeiro show do "Fruto Proibido".

Quando o show veio para São Paulo, no citado teatro “Aquarius”, entre 13 e 24 de agosto, o fenômeno se repetiu. O porquê de o show de estreia ter se dado no Rio de Janeiro e não em São Paulo, onde morava, foi explicado pela própria Rita numa entrevista, ainda no Rio, à revista Amiga, no início de julho de 1975, onde Rita justificou a decisão:

“O Rio sempre foi uma cidade aberta. É no Rio que se decide a moda e, por isso, decidimos lançar o show aqui. Vamos ver se levantamos São Paulo, que consideramos uma cidade triste.”

Sobre o tipo de público que frequentava os shows, Rita disse:

“O forte de nossa plateia são os adolescentes, a turma do ginásio e do colegial. Mas o primário e o Mobral também nos curtem demais...”

Depois de São Paulo, inúmeras apresentações ocorreram em todo o país, preferencialmente nas capitais. Segundo a então empresária Mônica Lisboa, foram 82 shows do “Fruto Proibido”, que se iniciou em agosto de 1975 no Rio de Janeiro, passando por São Paulo, e depois por cerca de 40 cidades por todo o Brasil, todas com menos de 90 mil habitantes, findando a turnê, ao que parece, em de março de 1976.





“Quem falou que não pode ser? 
Não, não...! Eu posso tudo!”

Rita, nos shows, era a "mulher dos sete instrumentos": além de cantar, dançava, tocava flauta, violão e sintetizador, portanto, uma artista eclética e, pasmem, autodidata! Na verdade, durante a infância, teve aulas de piano com a musicista clássica Magdalena Tagliaferro, e o autodidatismo se estendia à flauta, bateria, percussão e violão. À propósito, Rita tinha teclados que dificilmente as bandas de rock da época possuíam, isto, devido ao preço caríssimo, como Moog, Mellotron, Clavinete, Hammond e piano elétrico. 

Além disso — fato que raros comentam —, Rita é uma ótima desenhista e ilustradora, inclusive, a capa de se seu disco “Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida” (1972) é de sua autoria. 


Recriação de uma apropriação indébita...

Uma curiosidade na parte gráfica de "Fruto Proibido" é uma espécie de símbolo, que talvez funcione como um logo do disco, usado na contra-capa e encarte, um desenho que lembra algo uma pata de gato em que um dos dedos, que possui dois anéis, espeta com a unha algo como uma cereja (seria o tal “fruto proibido?...).

Pois bem: este desenho foi surrupiado de um disco lançado em 1972 no EUA, chamado “Rock On”, da banda The Bunch, na verdade, uma reunião de músicos de duas bandas folk-rock da época: a Fairport Convention e a Fotheringay, onde fazem releituras de clássicos do rock’n’roll. A ilustração original do disco da Bunch é uma pintura em aerógrafo que lembra uma pata estilizada, meio rococó, com um anel e outro ornato que, na verdade, é um cabeçote de braço de toca-discos, e a unha representa a agulha, que por sua vez sulca um disco. O verso da contra-capa do disco da Rita atribui a arte à um tal de Kélio, e pode ser que seja ele o autor do desenho, e se foi apenas o diagramador, a arte pode ser de autoria da própria Rita, que recriou a arte original em papel vegetal e nanquim.

Como o disco da Bunch não foi lançado no Brasil, não se sabe a "proveniência" do exemplar utilizado no processo, se foi comprado em lojas importadoras ou mesmo sua capa vista num catálogo de discos ou revista de rock, mas quem sabe o então namorado da Rita Lee, o Arnaldo Batista, não trouxe a bolacha dos EUA quando foi comprar equipamentos para os Mutantes por lá em 1973.


Portanto, amigos, estamos diante de um caso de apropriação indébita e recriação de uma arte alheia, caso que, por sinal, passou despercebida de todos por décadas, e coube a este que vos escreve levantar esta perdiz... Se acalmem: isto não desmerece em nada a obra-prima que é “Fruto Proibido”, não passando o fato de um pecado venial da nossa querida Rita.


Rita, compositora de mão cheia

Outro pormenor que também chamava atenção em Rita no disco era o fato de que ela se revelou uma ótima e promissora compositora. E não é a toa que “Fruto Proibido” se encaixa naquele raro caso em que um disco normal de um artista mais parece uma coleção de hits, tantas são as composições boas no disco! Da minha parte, diria: "Pena este disco não ter sido duplo, e músicas não faltavam para isso!" Convém ressaltar que as canções são relativamente complexas, cheias de lirismo e sentimento, com muitas variações não só nas harmonias, mas também nos arranjos. Vira e mexe, penso aqui comigo: "Qual foi a reação dos irmãos Dias Baptista — me refiro ao Sérgio e o Arnaldo — depois de ouvir este disco pela primeira vez?...

Aliás, em se falando de mulheres na música, Rita levava grande ”vantagem” sobre a maioria esmagadora das cantoras nacionais, pois, como vimos, também era compositora, e compositora de mão cheia, inteligente, humorada e criativa. E, caso não saiba, caro leitor, Rita é fã de Dolores Duran, e nela deve ter se espelhado. Pois é: para Rita, Dolores foi uma pessoa incrível: "Ela sempre me impressionou porque era uma mulher que compunha e cantava"...

Outro (grande) pormenor a ser levado em conta sobre a Rita compositora, é o fato de que ela tem um estilo todo próprio e pessoal de compor, e basta ouvir uma nova música sua gravada por outro intérprete para atinar de pronto que se trata de composição sua, o que não é pouco!
 
E a crítica era unânime em afirmar que ela era a única artista brasileira que fazia rock genuinamente nacional, numa linguagem simples e atrativa, fato a que também faz jus o seu equivalente masculino, o “Rei do Rock Brasileiro”, Raul Seixas. E era isto mesmo: capacidade de poucos na época, “Fruto Proibido” era uma aula de ”como se fazer rock em português”.



Sua empresária na época, a Mônica Lisboa, disse que Rita era uma espécie de bandeirante do rock, “assim como uma exploradora que pretende cantar um rock tão brasileiro quanto o samba”. Aliás, desde o disco anterior, ela dizia para a crítica que “estava propondo canções fáceis de imediata assimilação, com uma linguagem quase infantil, que faz mais meu gênero.” Sobre sua arte e a artista que era, na mesma época, Rita foi enfática:

“A minha música é um teatro vivo, porque eu estou numas de querer falar com as pessoas que eu não estou numas de querer definir uma pessoa em mim.”


De todo modo, à sua revelia, 
Rita se tornou uma superstar!...

O irônico nisto tudo é que, no final de 1974, citou-se que Rita havia sido dispensada da gravadora Phonogram sob a alegação que não vendia discos nem dava lucros. O problema se referia, em especial, ao seu primeiro disco com o Tutti Frutti, o citado “Atrás do Porto Tem Uma Cidade”, considerado um disco fraco pela crítica. Na verdade, os anteriores também não haviam vendido à contento da gravadora. No mesmo final de ano, Rita foi contratada pela Som Livre, e a história e o resultado todos conhecem decor e salteado... Desnecessário dizer que os magnatas da Phonogram deve ter se arrependido à beça com a partida da talentosa rockeira!... Numa entrevista à revista Música, em abril de 1977, Rita revelou a verdade:

“A gravadora não tem muita visão. Na minha época da Phonogram, por exemplo, eu tinha acabado de sair dos Mutantes e era o meu primeiro trabalho com o Tutti Frutti. Eu pretendia um trabalho de não levar as coisas a sério, mas propositadamente. Mostrar para as pessoas o porquê de não levar a sério. Mas a Phonogram me deu uma brecada. ‘Atrás do Porto’ foi uma barra. Eles pretendiam que eu assumisse uma de superstar, e eu não queria isso. Eles não tiveram paciência de esperar e optaram pelo João Ricardo. Eu resolvi sair. Resultado: o maior desastre da Phonogram não fui eu, foi o João Ricardo. Ele é o grande exemplo de coisa fabricada."

Outro motivo alegado por Rita era que a gravadora, num clima de “discriminação pessoal em relação ao artista”, insistia que ela não fizesse parte do grupo Tutti-Frutti, e ela garantia que é parte de um conjunto e não estrela”. 



Noutra entrevista à revista Sétimo Céu, em agosto de 1975, se referindo ao novo disco “Fruto Proibido”, Rita disse que “o trabalho é do grupo e não só meu! Quanto à Phonogram, aquela postura podia revelar que a gravadora a queria como artista solo e não como um mero membro de um grupo. Rita disse ainda que, na Som Livre

“a gente encontra seres humanos como João Araújo, que é o chefe, que vem apertar a mão de cada um do conjunto, não fazendo distinções entre mim como estrela e eles como acompanhantes.”

Vale lembrar que o João Araújo, era nada mais nada menos que o pai do cantor Cazuza e dono da Som Livre. 


Curiosamente, a própria Rita não tinha pretensões de ser artista solo e citou que lhe bastava ser uma crooner — ou “corista”, como ela própria dizia — de uma banda de rock . À propósito, ela fez muito isso nos tempos do Teen Ages Sister, um conjunto de rock formado só por meninas que ela tinha nos tempos de pré-adolescência. Numa entrevista à revista Manchete em 1981, Rita confidenciou: “Gosto mesmo de compor. Não acho que seja assim, cantora, sabe?”



Numa incrível coincidência, o mesmo se deu com o Elton John, pois quando deixou o grupo Bluesology, ele não vinha se talhando para ser um cantor, e mais de uma vez na época revelou que apenas queria ser o músico instrumentista de uma banda, e também compositor para ter suas produções gravadas por outros. Produtores insistiram que ele cantasse e ele mesmo disse ter sido "forçado a ser cantor"! Por fim, quando se tornou interprete, gostou muito, e, com certeza, o mesmo se deu com Rita... Em abril de 1978, numa entrevista à revista Nova, Rita não perdeu a oportunidade de esnobar o inglês, após tê-lo visto “perdido” em pleno carnaval carioca:

"Coitado; não sabia o que fazer quando aquelas mulheres deslumbradas se atiravam nos braços dele, gritando ‘Elton, Elton!’ Tudo, tudo mentira. Tudo só pra fotógrafo fotografar e pôr na revista; tudo falso, uma alegria fingida."


O compacto que antecedeu o LP e os protoclipes

O grande sucesso do show “Fruto Proibido” deveu-se ao fato de a balada "Ovelha Negra" (o disco havia sido lançado antes dos shows) ter galgado o primeiro lugar das paradas de sucesso. 



Logo depois, foi a vez de outra canção — o rock "Agora só falta você" —, atingir o segundo lugar. Como vimos, o que também colaborou no sucesso e ajudou a catapultar as vendas foi sua participação no programa do Fantástico, da Rede Globo, num protoclipe cantando “Ovelha Negra”, em 15-6-1975. 

A edição de domingo do Jornal do Brasil de 10-8-1975, traz uma nota neste dia, onde se lê:

”20hs — Fantástico, o Show da Vida (...) Hoje: Rita Lee e a banda Tutti-Frutti Falando sobre um tal de Roque Enrol”.

Aqui o vídeo!



“Agora Só Falta Você” foi ao ar em 5-10-1975, onde ela aparece voando com os aviões da Esquadrilha da Fumaça, os célebres North American T-6, aviões barulhentos já em vias de se aposentar, ao contrário de Rita que voava cada vez mais alto.


Em 16 de julho Rita participou do programa Globo de Ouro Especial, onde cantou seu maior sucesso, “Ovelha Negra”. Em 25 de janeiro do ano seguinte, Rita voltaria ao Fantástico, mas não se sabe ela cantou ou deu uma entrevista. 



Em meio ao sucesso crescente, no final de 1976, a banda mandou imprimir um curioso cartão de Boas festas com fotos e o nome de todos da equipe.



Rita Lee, a campeã em participações 
em trilhas sonoras de novelas

Ainda na esteira do sucesso, duas canções do disco foram parar na trilha sonora da novela “Bravo”, em 1975: abrindo o Lado A do disco, lá estava o petardo “Esse tal de Roque Enrow”. E, já bastante “batida”, no Lado B figurava “Agora Só Falta você”.

Na verdade, Rita já tinha uma composição sua em novela cinco anos antes, a canção “Sucesso, aqui vou eu”, que integrou a trilha de “A Próxima Atração” de 1970.

Surpreendentemente, seu maior hit, “Ovelha Negra”, não integrou a trilha de nenhuma novela na época, e só em 1993 é que foram aproveitá-la na novela "Mulheres de Areia”.

A partir de “Fruto Proibido“, este fenômeno de participação em trilhas ganhou corpo, pois Rita se tornara uma contumaz “frequentadora” de novelas globais — sendo considerada hoje a campeã neste quesito —, com a inclusão de, até o momento, nada mais nada menos que 72 canções suas nos bolachões e CDs, façanha para poucos, reconheça-se. No entanto, grande parte das gravações foram versões de outras bandas e artistas, e também convém lembrar que muitas delas são em parceria com seu marido, o guitarrista Roberto de Carvalho.


Dados técnicos sobre a gravação


- Produtor: Andy Mills
- Assistente de Produção: Otávio Augusto
- Técnicos de gravação: Flávio Augusto e Luis Carlos Baptista
- Técnico de Mixagem: Luis Carlos Baptista
- Gravado no Estúdio Eldorado - São Paulo - Abril 1975
- Arte: Kelio
- Foto: Meca


O instrumental do disco

O produtor norte-americano Andy Mills, que veio ao Brasil na turnê de Alice Cooper em março de 1974 e resolveu ficar por aqui após o retorno da banda, acabou se empregando como programador visual do show “Atrás do porto tem uma cidade”, no que se tornou namorado de Rita Lee. Depois empregou-se na Som Livre, onde comandou as gravações de “Fruto Proibido”: como se vê, uma grande parceira em ambos os casos!...


O baterista Franklin Paolillo comentou sobre a qualidade de gravação do disco:

“Todo esse clima de liberdade e rock’ n’ roll puro foi aproveitado por Andy Mills, então produtor de Alice Cooper. Na época, após uma passagem de Cooper pelo Brasil, Rita Lee foi comprar equipamentos do músico, conheceu Andy e eles começaram a namorar. O romance trouxe a expertise norte-americana para a produção de Fruto Proibido, que ganhou um acabamento raro no Brasil de 1975."

À propósito, um dos detalhes que mais chama a atenção na gravação o disco é a bateria de Franklin, não só pela execução mas também pela qualidade obtida na época. Franklin explicou:

“É um cara muito importante, principalmente pelo que conseguiu de som na época. Quando você ouve o disco, uma coisa que chama bastante a atenção é a bateria ‘meio na cara’, o que não era nada comum.”

Franklin Paolillo e Luiz Carlini
O próprio Andy Mills, disse numa entrevista à revista High Fidelity, que se impressionou não só com ele, mas também com a guitarra do Carlini. O mesmo se deu com o baterista do Alice Cooper, que ficou completamente abestalhado com a técnica do baterista Pedrinho do Som Nosso de Cada Dia, que abriu os shows de sua banda na época.

Por este disco, inúmeros bateristas brasileiros tem em Franklin não só uma grande influência, mas também um dos melhores e mais estilosos bateristas nacionais de todos os tempos. O toque firme e explosivo, a precisão milimétrica das viradas incríveis de caixa, tons-tons e tambor em conjunção com o bumbo, e, surpreendente, a impressão de que há uma espécie, por assim dizer, de sustainer no chimbau, que soa maravilhosamente bem em consonância com a caixa. O trabalho feito em “Fruto Proibido” lhe valeu, em 1978, uma participação no disco “Musicar” do João Ricardo, ex-Secos & Molhados, que inclusive lhe convidou para tocar no disco após ouvir seu trabalho no “Fruto...”, exigindo até que tocasse da mesma maneira.

E Franklin, realmente — com apenas 19 anos na época —, já era detentor de um estilo único de bateria, que se podia dizer, com toda segurança, que ele estava para “Fruto Proibido” assim com Bill Bruford estava para “Fragile” do Yes, e, igualmente, Mick Tucker para “Fanny Adams” do Sweet. Assim coloco, justamente por que, nos três discos, os estilos e as gravações de bateria eram a tônica e o charme das gravações. E, acima de tudo, desnecessário dizer que gerações de bateristas surgiram e se forjaram inspirados por estes discos, seja aqui, seja lá fora.


Músicos

- Guitarras: solo/base/slide/violão acústico/gaita/vocal em "Agora Só Falta Você": Luis Sérgio Carlini.
- Contra-Baixo/Cowbell: Lee Marcucci.
- Bateria/Percussão: Franklin Paolillo.
- Piano/Clavinet: na gravação foi o Guilherme S. Bueno, e nos shows o Paulo Maurício, que, inclusive consta das fotos na capa.
- Violão Acústico/Sintetizador: Rita Lee.
- Vocais: Rubens e Gilberto Nardo.
- Arranjos: Rita Lee & Tutti-Frutti.
- Arranjos vocais: Rita Lee.

Sobre a união Rita + Tutti Fruti, foram cinco anos de trabalho, tendo como “frutos” um compacto duplo, dois compactos simples, várias músicas em novelas da Globo, vários hits nas rádios, tours pelo Brasil e os cinco álbuns feitos em conjunto: “Atrás do porto tem uma cidade” (1974), “Fruto proibido” (1975), “Entradas e bandeiras” (1976).




Fazendo-se justiça ou Reparando um erro

A contra-capa, a relação do músicos que participaram da gravação, traz o nome do tecladista Guilherme S. Bueno, que trabalhou no disco apenas nas gravações em estúdio, e depois foi ser tecladista da banda Made in Brazil na fase “Jack, o Estripador, músico oriundo de Ribeirão Preto. Já o lado interno do álbum trás o novo tecladista, Paulo Maurício. Também na parte interna, a foto da banda está invertida, mostrando a guitarra e o contrabaixo como se fossem de instrumentistas canhotos (na verdade, a foto foi tirada de um espelho...). Ao que eu saiba, ninguém nunca comentou estes detalhes. Aqui, a correção definitiva!... 



Na foto, à esquerda, junto da banda Made in Brazil, em 1976, Guilherme S. Bueno, o incógnito e esquecido tecladista de “Fruto Proibido”, que, por sinal, fez um trabalho fantástico. É incrível que com tais arranjos incríveis e belíssimos de piano, arranjos dançantes no melhor estilo boogie-woogie, ninguém comente ou se lembre do trabalho desse grande músico! Seu estilo lembra também às vezes algumas músicas do Elton John, como, p. ex., "Honk Cat", ou seja, um piano no animado estilo ragtime dos antigos pianistas negros do sul dos EUA. Seus arranjos de piano deram um sabor todo especial ao disco, quase se sobrepondo aos outros instrumentos em todas as canções.


À esquerda, Guilherme, com a banda Made in Brazil em 1976.


O baterista Franklin Paolillo, em entrevista concedida à revista Modern Drummer, em março de 2011, além de revelar que as bases do disco foram todas gravadas juntas ao vivo (guitarra, baixo, piano e bateria), e depois foram colocadas as vozes, sintetizadores e solos de guitarra, comentou sobre o trabalho de Guilherme na banda:

“Ensaiávamos na casa de Rita, na Vila Mariana, numa salinha com piano. Ela ficava no piano, o Carlini e o Lee nos violões e eu tocava as músicas numa cadeira. Foi assim que fizemos os arranjos! Uma coisa importante foi que, depois de dois ou três ensaios nesse esquema, entrou o Guilherme Bueno, pianista, que caiu como uma luva na banda e me inspirou muito nas levadas das músicas. Foi uma coisa muito natural: ele chegou e já rolou uma química muito forte. Fizemos um dez ensaios assim, sem batera Depois a empresária alugou um galpão na Vila Alpina, montamos o equipamento e fizemos uns dois ensaios para ajustes finais e para começamos as gravações do disco.”

O irônico nesta história, é que quando um repórter, anos atrás, foi entrevistar Guilherme em Ribeirão Preto, ele não só fez pouco caso de sua participação no célebre disco, como também deu de presente para o mesmo o único exemplar que possuía do “Fruto Proibido”, que trazia guardado consigo desde a época!... 

De todo modo, a justiça foi feita aqui!

Aqui, uma entrevista do guitarrista Luis Carlini, em 2010, comentando os 35 anos do disco "Fruto Proibido" e detalhes das gravações:



Abaixo, texto extraído do site Banda Made in Brazil.




O disco comentado, faixa a faixa


Lado A:

1 - Dançar Para Não Dançar (Rita Lee): rock que abre o disco com um piano numa levada meio à cabaré. O contrabaixo Rickenbacker de Lee Marcucci viaja tranquilo fazendo um esteio perfeito para a canção. Os efeitos de sintetizador e o tremolo colocado no piano elétrico caíram muito bem no arranjo no final. Os backing vocals do irmãos Nardo já estreiam com competência nesta música, que era considerada um dos pontos altos do show, pois a coreografia que Rita fazia junto deles foi considerada “sensacional”. O estilo personalíssimo de bateria do Franklin Paolillo — a sua inconfundível pegada suingada —, chama a atenção já nesta música, destacando-se os backbeats, que são reforçados com aberturas de chimbau nos contratempos, coisa rara em bateristas. 

2- Agora Só Falta Você (Rita Lee e Luiz Carlini): Uma suave guitarra slide abre a música, e num crescente agressivo descamba numa bela canção que tem um dos melhores e mais rápidos solos do grande Carlini. A bateria é um show de estilo e precisão, fazendo uma levada com bastante suingue durante o solo de guitarra, a partir do 1:30 minutos; já nos oito compassos finais, a partir de 3:02, há um show de frases e variações. O trio de vozes de Rita e irmãos Nardo soa impecável. Embora alguns vejam um quê feminista na letra, outros poderiam imaginar que é uma recaída de Rita, digo, que ela poderia se referir ao seu ex, o Arnaldo Dias Baptista, mas Rita já estava em outra há muito, além de que, segundo o próprio Carlini, ele se referia uma uma sua ex-namorada...

3 - Cartão Postal (Rita Lee e Paulo Coelho): um blues lento composto em uma parceria com Paulo Coelho, que até então só havia escrito letras com Raul Seixas, do qual havia se desligado recentemente. Calcado no piano e numa dolente guitarra slide, não é um blues convencional de poucas notas, mas complexo e com variações. Em suma, é um desses blues de botequim escuro e esfumaçado, blues de fossa, para fumar encher a cara.

4 - Fruto Proibido (Rita Lee): o que há de dolência no blues anterior, há de alegria e vitalidade neste hard rock, marcado pela gaita de Carlini, pelo piano de Guilherme e a bateria explosiva de Franklin, música que é uma de suas prediletas. Nota-se nesta canção que a voz de Rita tinha um timbre ligeiramente diferente do atual, que se solidificou, ao que parece, no disco Babilônia, de 1978. Mesma assim, Rita se mostra madura, com competente interpretação e abusando de gritos agressivos. Porém, a música finda com violão de uma maneira bem terna.

5 - Esse Tal de Roque Enrow (Rita Lee e Paulo Coelho): A bateria mais marcante do disco, com uma levada bem particular de Franklin, que faz misérias nas viradas. A música já abre num duo com a guitarra, com Franklin fazendo uma abafação do prato crash com uma pegada animal. Carlini também reveza na gaita ao lado do “incrível” Manito, que faz belos floreios no saxofone. Nota-se na canção a grande habilidade de Rita como compositora: uma canção com belas variações, que, definitivamente, vieram provar que não era uma rockeira qualquer, e que estava sim à altura de seus ex-companheiros “progressivos” nos Mutantes... In my humble opinion, o melhor solo de guitarra de Carlini, melhor até que o de “Ovelha Negra”, onde sua Gibson tem um belíssimo som gutural, com uma qualidade de timbre que poucos tinham na época, lembrando o do Ace Frehley do Kiss. Aos 2:53 minutos a virada de Franklin à la Don Brewer do Grand Funk é a “cereja do bolo”! Finalmente, os backings dos gêmeos junto de Rita são divinos.

* O que representaria o desenho de Rita Lee do encarte acima? Seria a pata 
de Zig, a jaguatirica de estimação de Rita espetando um fruto proibido?...

Lado B


1 - O Toque (Rita Lee e Paulo Coelho): a faixa começa com um órgão Hammond à cargo do Manito, com o registro tratado, ao que parece, com phazer, o que ficou muito bonito, lembrando uma guitarra, e é ele que faz a base ao longo de toda da música. Os backing vocals, sempre belíssimos. Na mudança de rumos da canção, nota-se o incrível lirismo de Rita: a arte de mesclar peso e sentimento. Enfim, uma letra com um "toque" bem Era de Aquarius beirando o ecológico.


2 – Pirataria (Rita Lee e Lee Marcucci): um dos mais belos riffs de guitarra do disco, além do piano que está belíssimo e marcante. A beleza desta canção (também) reside no fato de uma ter uma levada suingada ao estilo dos The Archies. Ao final, a partir do 3: 48 minutos, o clima da musica muda de um jeito empolgante, e Manito entra com sua flauta numas de John Anderson do Jethro Tull; em seguida, vem o Carlini com outro belíssimo solo de guitarra. As palmas e os vocais agudos dos irmãos Nardo nos refrões finais ficaram ótimos.




3 - Luz del Fuego (Rita Lee): é outro ponto alto do disco, começa com um ótimo riff de guitarra e nos intervalos temos ótimos solos. É uma música de contornos sérios, onde, fora o refrão, passa um sentimento que soa trágico. Tem ótima letra,  que particularmente, me soa como uma auto-profecia de Rita.

4 - Ovelha Negra (Rita Lee): O disco é fechado com chave de ouro com esta pérola que, convenhamos, dispensa apresentações, destacando-se o arranjo de piano que tem um lirismo que remete à "Your Song" do Elton John. . Desde a época, é considerada “o Hino de Rita Lee”,  ou “um manifesto infanto-juvenil”, estando entre as suas principais canções. Se tornou um clássico do Rock Nacional, um baladão que se encerra com outro solo antológico de Carlini, um daqueles típicos casos em que "menos é mais". O guitarrista sempre afirmou que foi a partir de um sonho que o criou, e que o tocou de olhos fechados na hora da gravação. Ele conta que precisou insistir com Andy Mills para incluí-lo ao final da faixa. Felizmente, o gringo cedeu...

O que disse Carlini sobre o episódio:

“Eu sonhei com o solo e acordei assobiando. Fui para o estúdio (o disco já estava sendo mixado) e pedi para gravá-lo. Os técnicos disseram ‘fica quieto aí cabeludo, você não vai fazer mais nada aqui’. Mas eu fui tão insistente que deixaram. Quando terminei, o Andy Mills (produtor do Alice Cooper) me chamou para a sala de mixagem e disse: ‘Vai embora daqui. Eu gravei, está pronto e você nunca mais vai mexer nisso’. O solo, feito de um riff simples que se repete até o fim da faixa, virou referência para os guitarristas brasileiros. ‘Fiz um bilhão de solos depois, mas nenhum foi tão famoso quanto esse’, conta Carlini.”


“Fruto Proibido” no EUA!

Andy Mills brincando com Rita.
Cita-se que o próprio Andy ficou tão empolgado com a qualidade de “Fruto Proibido” e seu impacto na mídia, que tentou negociar seu lançamento no EUA, o que infelizmente não ocorreu, e não se sabe o porquê. 

À esta altura, podemos concluir que se Rita tivesse nascido no EUA ou na Inglaterra, o sucesso à nível mundial seria inevitável... Aliás, alguém aqui se esqueceu (ou sabia) que nada mais nada menos que o Eric Clapton (acho que em 1975), em visita ao Brasil, se deslumbrou ao ver a Rita executar "Mamãe Natureza" e cogitou de gravá-la? Ou que a banda new wave Television, ao ouvir "Papai Me Empresta o Carro”, também... cogitou de gravá-la?... É o que eu repito, amigos: não é para qualquer um!... Enfim, pobre do tal jornal londrino por ignorar quem é "Rita Who", que não sabe o que estão perdendo!...


Rita e Rod


Cita-se que na visita que o cantor Rod Stewart fez ao Brasil em fevereiro de 1978, à princípio, ele não queria saber de conhecer as bandas de rock brasileiro. Porém, Rod foi convidado por Caco Barcelos e Ângela Dust, ambos repórteres da então revista Geração Pop, para uma visita
ao estúdio Level onde Rita e Roberto gravavam seu novo disco, o ótimo Babilônia. Rod ouviu três músicas com um sorriso nos lábios, e gostou tanto que chamou o Roberto de Carvalho num canto e disse: “Adorei o som de vocês. Faço questão de convidá-los para jantar e dançar”. 

Ao conhecer Rita pessoalmente, e passar durante duas horas para ela a receita de seu visual, o homem ficou maluco por ela, mas, segundo a revista. o Roberto advertiu: “Não vem que não tem!”...

Dias depois, Rita decidiu fazer um carnaval particular em sua própria casa, e convidou diversos superstars do rock brasileiro e internacional para a festa – dentre eles, Elton John e Peter Frampton. Rod ficou sabendo do auê, mas... não foi convidado... Dizem que o britânico ficou espumando de ódio...

The End

Sobre o “Fruto Proibido”, na citada revista Sétimo Céu de agosto de 1975, Rita revelou:




“Foi o primeiro disco que eu consegui curtir depois de feito. O único que não ficou velho. Antes, eu curtia enquanto o disco estava sendo feito; depois de pronto eu descurtia e era terrível. Esse, cada vez que eu escuto, gosto mais.”





A benção, Santa Rita!

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* Este texto faz parte da série de oito livros memoriais que venho escrevendo sobre a Usina Palmeiras (Araras-SP), intitulado: "APÓLOGO 11 -AS REINAÇÕES DE UMA MOLEQUE NA ERA DA CONTRACULTURA. Vol. r – All things must pass– janeiro de 1975 a abril de 1977". Os livros estão em processo de confecção sem prazo para lançamento.