terça-feira, 6 de agosto de 2013

PIONEIROS DO PUNK EM ARARAS

Neste ano em que se comemora os 30 anos do movimento Punk Rock, ou seja, 2006, tenho algo para contar sobre minha modesta carreira musical, e assim,  fazer uma homenagem a cinco amigos falecidos. Tudo começou em meados de 1976, quando eu (foto) havia ido para Campinas para comprar uns discos de vinil na antiga loja Carlos Gomes, na rua Treze de Maio. Na volta, quando entrei na rodoviária, fui até a banca central e comprei um exemplar da revista Rock, a História e a Glória, o Nº 25, cuja biografia era do Frank Zappa, lançada em 21 de outubro de 1976. O destaque do Jornal de Música, que era o encarte  da revista, trazia uma matéria de duas páginas, em letras miúdas, sobre um novo movimento musical que surgia na Inglaterra – o Punk Rock. A matéria, muito interessante, foi lida por mim numa só passada. Infelizmente, este jornal perdeu-se, logo eu, tão cuidadoso com meu arquivo musical. E essa reportagem mexeu comigo de tal forma que, em pouco tempo, eu já havia comprado os primeiros discos do Clash, Television, Dr. Feelgood, Vibrators e Eddie and The Hot Rods; também o primeiro das gatinhas Runaways, e os segundos do insólito Stranglers e do ótimo New York Dolls.

No ano seguinte, em outubro de 1977, o Brasil conheceria esse movimento musical através da famosa revista POP – precursora da BISS –, que lançaria o incrivelmente famoso LP “Punk Rock” (foto), com, nada mais nada menos, que o Sex Pistols, Ramones, Runaways, The Jam, Stincky Toys, Eddie and The Hot Rods e Ultravox. Foi uma verdadeira paulada em nossas cabeças – um disco clássico e histórico: discoteca básica. No mesmo ano, um amigo nosso nos apresentava o histórico primeiro LP dos Sex Pistols – foi um arraso. Eu cheguei a tirar todas as músicas do disco – uma glória para mim: um adolescente que mal havia estreado na guitarra. Outro disco que nos fez cabeça, foi o excelente primeiro LP do Joelho de Porco – ainda hoje é um disco que surpreende pela qualidade.

Bem informados do novo movimento, formamos a primeira banda (e turma) punk de Araras. Recordo-me que tocávamos músicas do Clash, Sex Pistols, Dr. Feelgood, Joelho de Porco, Made in Brazil e algumas do disco da POP. (na foto à esquerda, Mário Silvestre, de Araraquara)

Uma curiosidade: lembro-me, em 1977, de minha turma na escola Alberto Feres (“Industrial”), e que íamos assistir aula todos de punk. Um dia o diretor entrou em nossa classe e estávamos todos alinhados no fundo, impecavelmente trajados de jeans, jaquetas de couro ou terno, correntes e alfinetes, botas, ray-bans, etc. Ele, o “Seu Felício”, colocou o dedo indicador acima dos lábios e olhou-nos detidamente de cima para baixo; depois, sem nos repreender, saiu da classe meneando a cabeça e com um leve sorriso nos lábios...

No mesmo ano, fomos o destaque do carnaval da Associação Atlética Ararense. Éramos cerca de dez caras, todos de punk e chamávamos a atenção por onde passássemos por nossos trajes bizarros. Certamente, um bando de jovens vestidos de maneira provocativa e estranha compuha uma imagem de grande apelo simbólico – uma imagem forte, que atraia o olhar de quem se deparava conosco.  Compunha esta turma, eu, meu irmão Weber, Mábio Francatto (in memorian), Fernando Neodini, Fernando Martins, Cláudio Bizão (in memorian), Sudenir Franco, Mário Silvestre (de Araraquara, foto acima), Marcelo Aragão, Lourival, “Pulenta” (in memorian) e José Mário Cabrini, dentre outros. Houve uma foto clássica neste dia, todos juntos da polícia, que, infelizmente se perdeu. Convém ressaltar: não éramos um bloco e nem estávamos fantasiados. Na foto acima, Lore Cabrini, Cida Chiarotto (in memorian) e Fernando Neodini, no carnaval da A. A. A.

Nosso primeiro show como banda punk se deu na Biblioteca Municipal de Araraquara, onde um dos nosso músicos, o Mário Silvestre, morava. Inicialmente, a banda era composta por Marcelo Aragão na guitarra, Mário Silvestre no baixo, Borg nos vocais e eu na bateria. Em 1979, com nova formação, tocamos em Araras no então restaurante “Forasteiro” (foto). O nome da banda dizia tudo: “Os Vândalos”... O dono da casa ficou louco com o tipo de música que tocamos, e o tempo todo pedia para que levássemos um sambinha, por que “que atrairia mais público”... Com a insistência, à certa altura, revoltado, fiz o show de bateria mais barulhento e nervoso de minha vida só para desforrar.  Outro show memorável se deu na antiga discoteque “Don Diego”, no mesmo ano, casa noturna cujo palco ficava num mezzanino. Houve dois fatos curiosos neste dia: o primeiro, se deu com o falecido “Helião” (Hélio ) – um sujeito enorme e muito forte, e que era fã do Borg –; como se a banda demorasse para subir ao palco e tocar, a certa altura, ele “abraçou’ o palco e começou a chacoalhá-lo pedindo que a banda começasse o show. O segundo, mais tragicômico, foi o próprio Borg surrupiar do caixa, na surdina, aquele que foi o primeiro cachê da banda...

Na foto ao lado, no Forasteiro, Lore Cabrini ao fundo, no contra-baixo; ao centro, Mábio Francatto na guitarra e o vocalista Borg Domingues, ambos falecidos. Weber Daltro também dividiu os vocais com Borg por um período. Na foto seguinte, eu na bateria.

Enfim – verdade seja dita –, posso afirmar sem modéstia que, além de ser o introdutor do punk em Araras, toda a nossa turma fomos punks em consonância com a própria Inglaterra, e isto, antes mesmo que a movimento se solidificasse na própria São Paulo capital, o que se deu no início dos anos 80. Não nos esqueçamos que Araras vivia em plena efervescência da chamada onda discoteque, com shows e festivais de dança na maioria dos clubes da cidade. Nós, por nossa vez, "pregávamos", sem eco algum, num deserto cultural chamado Araras!...

É tudo.